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Sexta-feira, 03.07.15
«viver num ninho de espiões» de maria joão martins
A colecção «Lisboa revelada» nasce de um propósito: «revelar Lisboa como outrora se revelavam fotografias – com vagar e na expectativa de sermos surpreendidos por algo que não víramos no momento de «disparar». Lisboa não é uma só, feita de um punhado de dados históricos e demográficos, é múltipla e esquiva, oferecendo-se e, no entanto, resistindo a quem a procura decifrar. Ou não fosse também ela Olisipo, a suave criatura das águas que, há muito, muito tempo, chegou a abrigar a exaustão de Ulisses.» Este livro tem um subtítulo clarificador «Lisboa-Estoril, 1939-45». Lisboa era definida por Saint-Exupéry como um «paraíso claro e triste» e era nesses anos o lugar aonde chegavam escritores, artistas de cinema, banqueiros, reis sem trono e espiões: Louise Rainier, Leslie Howard, Carol da Roménia, Stefan Zweig, Erich-Marie Remarque, Jean Gabin, Saint-Exupéry e muitos outros refugiados anónimos. Em Lisboa Portugal festejava os 300 anos da restauração e os 800 anos da fundação na Exposição do Mundo Português enquanto Coventry, Southampton, Londres e Paris sofriam ocupação e bombardeamentos. No Estoril a figura de James Bonde começa a ser idealizada pelo futuro escritor Ian Fleming a partir (diz-se) das aventuras do espião Popov. Também se diz que o Casino Royal é o Casino Estoril em metáfora. As páginas do livro viajam pelo problema dos abastecimentos de víveres («Uma galinha mediana custa 20$00») ou dos combustíveis: «O carvão, essencial quer aos transportes quer à vida doméstica determinaria no primeiro caso a redução de carreiras e no segundo a preferência por alimentos de confecção rápida». Uma peça de João Bastos intitulada «Refugiados» no Teatro Variedades foi alterada para «Gente de fora» por imposição da Censura. Outros temas aparecem nas páginas deste livro: o Futebol, o Cinema, a Rádio, o Teatro e a Noite com os seus «dancings», tudo isto debaixo de uma chuva de propaganda alemã, britânica e norte-americana. Mas também os artistas como Leslie Howard que desapareceu num avião da BOAC na noite do golfo da Biscaia ou o casal Vivien Leigh e Laurence Olivier que foram ao cinema e deram autógrafos aos espectadores. Mas se há muita coisa a mudar, há tradições que permanecem: «havia velhas tradições que ainda resistiam na primeira metade da década de 40. Melhor dizendo havia todo um conjunto de hábitos transmitidos de pais para filhos, que Duarte Pacheco não pôde abolir por decreto. A Lisboa que Thomas Mann e Stefan Zweig conheceram em horas de grande angústia, era ainda a dos concurso de vestidos de chita entre as moçoilas dos bairros, a dos pregões populares como «capilé, copo com água» ou «quem quer figos quem quer almoçar», a dos marçanos, dos padeiros, dos carvoeiros e das varinas, a dos cartazes onde a Liga dos Tuberculosos precisava de escrever «O homem civilizado não cospe no chão» (Editora: Gato do Bosque, Capa/Design: Ema Gonçalves) --
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José do Carmo Francisco
às 18:31
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