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Transporte Sentimental



Quarta-feira, 27.05.15

«viver e resistir no tempo de salazar» de maria alice samara e raquel pereira henriques

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Com o subtítulo de «Histórias de vida contadas na 1ª pessoa», este trabalho com 151 páginas foi feito por duas autoras de gerações diferentes (uma nasceu em 1974 e outar em 1962) e surgiu a partir de entrevistas a seis homens e dez mulheres. Foram depois consultadas cinco pessoas, todas com diferentes percursos pessoais. As memórias começam pela casa: «A casa onde vivíamos era uma casa velha, igual a tantas outras em pedra que vedava mal o frio e a chuva.» Continuam pelas roupas: «No início não havia cobertores, apenas mantas de fitas, feitas de tiras de roupa mais velha, tecidas depois em teares. Os lençóis eram feitos de umas sacas de açúcar, muito branquinhas, arranjadas por um tio meu». Depois a loiça da casa: «Quando havia um almoço ou um jantar pedíamos a loiça de casa uns aos outros». Sem esquecer os talheres: «Havia talheres de lata, alguns com cabo de madeira. Mais tarde apareceram em alumínio.» A falta de água canalizada era outro problema: «Ia-se buscar água à barroca, à ribeira. Agora é uma facilidade.»Nesse sentido, a casa de banho era um luxo: «Nós tínhamos a única casa de banho que havia naquela aldeia (Sipote). De tal modo era assim que passámos a acolher na nossa casa as professoras primárias.» Mas era tudo complicado: «Tínhamos rádio mas não tínhamos frigorífico. Só no 25 de Abril é que tivemos esquentador.» As normas da moral vigente surgiam de repente na voz de uma professora de Moral: «as meninas não devem andar de vermelho e preto que isso atiça os homens.» Claro que as alunas não sabiam sequer o que era «atiçar». Descobriam tudo, mais tarde, de modo doloroso: «O meu pai chegou a andar com três amantes ao mesmo tempo e uma delas tinha andado comigo na escola.» Ou noutro depoimento: «Mais tarde percebi que todos tinham amantes, era raro o casal da geração da minha mãe que se dava bem, contam-se pelos dedos.» Um outro aspecto tem a ver com a economia: «A resina na altura (anos 60) era a grande fonte de receita das famílias daquela zona da Beira. Trocávamos o dinheiro da resina por roupa. Entregávamos a resina num armazém que a comprava e levantávamos por conta da resina o açúcar, o arroz, as botas, as camisas e as calças.» No notar um pequeno lapso na página 43: o uso da palavra «estremenha» (de Estremadura) em vez de «estamenha» (tecido grosseiro) nada que altere o alto interesse do livro feito de depoimentos na primeira pessoa. (Editora: Verso da Kapa, Paginação: José Teixeira, Paginação: Joana Albuquerque) --

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por José do Carmo Francisco às 10:24



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