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Transporte Sentimental



Sexta-feira, 24.02.17

dissertação para um olhar da mulher-menina frente ao tejo

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Em Setembro de 1973 eu estava em Évora no serviço militar e ainda havia presos políticos em Caxias. Vinha muita gente do Couço e da Azervadinha que pernoitava em Vila Franca de Xira. No outro dia de manhã tomava o comboio para Santa Apolónia e fazia a pé, para poupar o preço do bilhete de eléctrico, o caminho desde Santa Apolónia ao Cais do Sodré. Em 1974 este olhar assentava as suas coordenadas na colina do Jardim da Estrela, no seu ponto mais alto, o Tejo em frente, a espuma dos cacilheiros que parecia sair do título de um livro de Fernando Namora nesse tempo: «O rio triste». Alguns anos depois esse olhar fixou-se no Cais do Sodré, ainda lá estava o chinês das gravatas, a velocidade dos rebocadores, os pregões das varinas, os apitos dos polícias sinaleiros e os eléctricos de atrelado com as suas campainhas e a sua lentidão. Uma mulher de meia idade, dessas que morrem sem deixar nem amor nem filhos nem saudades, cancelou um dia com um simples carimbo de borracha a entrada desta mulher-menina no Banco Português do Atlântico mas, uma semana depois, essa admissão consumava-se mas no Banco Borges & Irmão. Há neste olhar de mulher-menina uma espécie de cédula que despacha mercadorias: carvão da Silésia, borregos da Nova Zelândia, açúcar de Cuba, cera de abelhas da Guiné Bissau. No passado recente este olhar estava num palco do Sul de França com um rancho folclórico da região de Leiria tal como tinha estado no Verão anterior na apanha da maçã num rancho de raparigas com um capataz inflexível e quase sem tempo para elas fumarem um cigarro na pausa da colheita. Passaram quarenta anos mas o Mundo é o mesmo. --

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por José do Carmo Francisco às 19:36


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