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Transporte Sentimental



Quinta-feira, 09.02.17

«nunca direi quem sou» de vergílio alberto vieira

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Vergílio Alberto Vieira (n.1950) é poeta, ficcionista, dramaturgo, ensaísta, crítico literário e autor de livros para a infância. Celebrou os 45 anos de edição de poesia com «Todo o trabalho toda a pena» dado que o primeiro livro («Na margem do silêncio») é de 1971. Nestas dez narrativas dois dos títulos são da autoria de Sophia de Mello Breyner («Todas as cidades são navios») e Marguerite Yourcenar («O último acampamento do nómada»). Dou o nome de «narrativas» mas sem esquecer as lições de Italo Calvino: «Estou convencido que escrever prosa não deve ser diferente de escrever poesia; em ambos os casos é a busca de uma expressão necessária, única, densa, concisa, memorável». Cada uma das dez «narrativas» faz uma homenagem a um autor: Chuan-tzu, Sapho, Epitecto, Fernando Pessoa, Jorge Luís Borges, Vergílio Ferreira, Mário Cesariny, Dinis Machado, Clarice Lispector e Herberto Helder. Sendo «a literatura uma homenagem à literatura» o ponto de partida do livro de Vergílio Alberto Vieira é a vida («Fumando o último cigarro, dou-me conta de que passei parte da noite à janela do meu quarto») não uma vida em abstracto mas uma vida que se escreve: «A contradição é regra e escrever a mais suspeita forma de estar só». As perguntas são fortes («Ninguém sabe onde começa o mundo. Em que lugar da terra repousa a vida?») e as respostas só podem ser as do Estoicismo («Não cedas companheiro ao prazer») ou do Amor: «As mulheres as mulheres, não irradiam certas mulheres aquele aroma que só algumas flores, uma vez por outra, oferecem?» Memória de um lugar que já não existe (o «Expresso» onde minha filha Ana Maria ia todos os dias tomar um café com livreiro José Vicente) existe na página 85 deste livro uma revisitação que não se pode perder: «Ao Expresso onde às oito, tmg – sôr Assumpção, ao telefone – cairá o pano, Albertini, o acrobata, lá estará, olhem só este agora – para medir a temperatura de Deus, entre as demais, e depois será Verão, para que Lisboa, em camisa, esteja com ele e não arrefeça o carioca de limão, pedido à lista, já se vê, enquanto comentado, até que chegue mais algum porque à quarta é certo, anda a roda, e lá fora o bronzeado cauteleiro faz-de-conta-que-dá-sorte aos pombos revelhudos que a Dona Rosa adoptou há anos até que a morte e a Santa Casa os separe para sempre.» (Editora: Companhia das Ilhas, Direcção: Carlos Alberto Machado, Foto do autor: Sérgio Granadeiro) --

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por José do Carmo Francisco às 13:26

Quinta-feira, 09.02.17

o rei salomão da rua luz soriano (a gonçalo pereira, amigo e mestre)

Foto Jacinto Baptista.jpeg

A cena passa-se na redacção do «Diário Popular» nos anos 80 do século XX. Há uma mesa na qual um empregado (o senhor Seminário) coloca ao longo do dia pacotes de livros enviados pelas editoras portuguesas ao cuidado de dois jornalistas: Jacinto Baptista e Abel Pereira. Os redactores vão levando os livros para os lerem e escreverem uma nota sobre os mesmos. Às vezes há livros com vários candidatos: o «Fabulário» do Mário de Carvalho, por exemplo. Aí Jacinto Baptista vê-se obrigado a decidir. Outras vezes há livros nos quais ninguém pega. Recordo a «Lira de Líquen» do Nuno Júdice. Quando eu me propus a levar esse livro para o ler e escrever para o «Diário Popular» uma nota de leitura, logo algumas vozes se levantaram contra a ideia porque, no fim de contas, eu era apenas um colaborador, não um redactor efectivo. Na altura não percebi muito bem mas era o preconceito a funcionar porque até 1966 (fundação do CNID) os jornalistas desportivos eram sócios do Sindicato dos Tipógrafos e Ofícios Correlativos. Toda a gente ali sabia que eu tinha sido apresentado em 1978 a Jacinto Baptista por Carlos Pinhão porque o jornal A BOLA era impresso nas oficinas do «Diário Popular». Mas Jacinto Baptista tomou uma decisão salomónica: resolveu dar-me o livro do Nuno Júdice e marcou um prazo de oito dias para ter a nota de leitura despachada e entregue. Claro que na semana seguinte lá fui levar o resultado da minha leitura, ainda se escrevia à máquina num «linguado» com o logotipo do jornal no cabeçalho. Correu tudo nos conformes mas Jacinto Baptista já estava cansado e farto de ser o rei Salomão da rua Luz Soriano. Como se vê por esta amostra o pó e a posteridade estão às vezes separados por um pequeno acaso. Se eu não tivesse pegado no livro do Nuno Júdice ninguém tinha feito a notícia. --

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por José do Carmo Francisco às 09:42


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