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Transporte Sentimental



Terça-feira, 31.01.17

«a gorda» de isabela figueiredo

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Isabela Figueiredo (n.1963) faz neste livro de 285 páginas o inventário e o balanço de um certo tempo português, a chamada descolonização. As referências literárias parecem ser Nuno Bragança («A noite e o riso»), Maria Ondina Braga («Eu vim para ver a Terra») e Bruno Vieira Amaral «As primeiras coisas») e o seu romance, dedicado à sua mãe, organiza-se em oito capítulos, cada um deles sendo uma divisão da casa. Na casa ideal da página 39 tudo isso se explica: «Essa seria a minha casa, uma outra barriga da mamã.» A ligação da autora à mãe não é pacífica; umas vezes «conversam sobre todos os assuntos na cozinha», outras vezes as diferenças são notórias e notadas: «Ela é paciente e firme: eu, arrebatada e arrogante.» Ser gorda é algo que os rapazes do Ciclo Preparatório na Lourinhã martelam aos ouvidos da personagem principal: «ó orca, grande fúria dos mares, já comeste hoje alguém?» A relação com os pais é tensa («detesto os papás, não os quero de volta, bem podiam ter ficado por Moçambique») tal como é tensa a vida de todos os dias: «Comparo a nossa vida a uma travessia dos mares do sul, pejados de piratas e navegadores solitários, por vezes indistintos.» Perante o precário da vida e o inevitável da morte, surge o amor («O amor é um filme de péssima qualidade») e isto porque «A minha mãe casou para se amparar, o tio Alberto amou toda a vida a cunhada e nem no leito de morte lho revelou e a minha tia Inês negou-se ao rapaz por que se apaixonou por estar prometida ao tio Alberto.» Aos pucos uma certeza se instala no livro e no discurso: «Sabia viver sem os que amava mas sem escrita a vida não tinha por onde continuar. Podia viver sem tomar banho, sem beijos mas sem escrita não.» Os dois versos de Cesário Verde na estação do Metro da Cidade Universitária surgem como um projecto de vida («Se eu não morresse, nunca! / E eternamente buscasse e conseguisse a perfeição das cousas!») mas também como proposta de futuro: «Uma vida eterna talvez fosse suficiente para resolver o fogo, as brasas e as cinzas da efemeridade terrena.» A arte final do livro não o ajuda. Por um lado a capa com o «marketing» a tapar o desenho, por outro a badana apresenta quatro advérbios de modo juntos e depois o uso e o abuso do aborto ortográfico. A palavra Faculdade (Departamento de uma Universidade) aparece em caixa baixa que significa possibilidade ou capacidade. Mas o livro resiste a tudo porque não é apenas um testemunho (sangue pisado) mas está muito bem escrito (estilo). É nessa complicada relação entre sangue pisado e estilo que se joga toda a diferença. Este é um livro a não perder embora não abarque toda a história da Guerra Colonial (os mortos e os feridos) ou da chegada dos retornados ao Rossio e a sua integração (por exemplo) nos Bancos à custa das promoções congeladas dos que estavam cá e tinham expectativas legítimas. Mas isso é outra história. Este é um livro a não perder porque nele está muito bem contada esta história de uma família portuguesa no turbilhão atónito de uma vida perdida entre África e a Europa. (Editora: Caminho, Capa. Rui Garrido, Ilustração: Darla Dementyeva) --

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por José do Carmo Francisco às 10:34

Domingo, 29.01.17

«detergente» de ruy ventura

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Este é um livro especial, insólito e diferente na bibliografia de Ruy Ventura (n.1973) cujo primeiro livro («Arquitectura do Silêncio») recebeu em 1999 o Prémio Revelação de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores. A Poesia é (todos o sabemos) uma arte de fundo pessoal. O poema escreve o poeta; o poeta escreve-se no poema. Mas o poeta não é um organismo sentimental sem raízes, sem passado, sem biografia. Tal como neste livro, no qual surge um diálogo entre dois homens (João e Raul) sob um fundo musical de Olivier Messiaen. Trata-se de um tempo que chega ao fim, um mundo desolado, uma cidade deserta. Raul começa o diálogo na página 7: «Nascem no mesmo dia a força e a pobreza. A casa está cheia de entulho e as ruas não permitem a circulação. Vivemos entre escombros, já muitos o disseram. Por isso páro. Vivo? Sobrevivo? Existimos.» João, por sua vez, faz um inventário pessimista: «Há quem escreva versos mas dispense a escassez, o trabalho, a descoberta. Há quem vá filosofando mas rejeite o amor e a sabedoria. Há quem pinte, molde, filme, dance e represente mas feche os olhos às imagens que nos desafiam, como lava no dia de juízo.» É neste «caldo cultural» que Raul procura um futuro: «Temos de sorrir (dizem). Temos de suportar, ainda que a dissolução nos transforme em vermes, em roedores que voam ou rastejam.» João, por sua vez, proclama a força da escrita: Primeiro na página 9: «Entre a superfície da escrita e a ocultação da morte – não há negrume que nos apague.» Depois na página 10: «Quem escreve encontra o organismo: a instabilidade da matéria – cor e pó, memória e gangrena – um grupo de células que o fogo não destrói, que a terra não apodrece» Por fim na página 23: «Esquecendo, talvez consiga escrever. Excesso ou amnésia, o texto retrocede.» É nesta oscilação entre sangue pisado e estilo que surge o detergente que dá o título ao livro: «A memória descritiva assegura-nos de que a estátua (ou medalhão) é de bronze, de pedra ou cera d´abelhas. Mas no fundo temos a certeza de que o miolo da efígie não passa de sabão ou detergente.»

Sob a forma de peça de teatro, no fundo é de poesia e sua temperatura que trata este livro, Vejam-se as citações: «Odeio este tempo detergente» (Ruy Belo), «O obstáculo ou depura ou torna-nos perversos» (Cesário Verde) E a dedicatória: Para Levi Condinho, Nuno Matos Duarte e Rui Almeida. Em memória de Filipa Barata e Carlos Garcia de Castro. (Editora: Licorne, Capa e Foto no interior: Nuno Matos Duarte) --

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por José do Carmo Francisco às 10:33

Quinta-feira, 26.01.17

dissertação emocionada para uma foto de 1951

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Sou eu mesmo este menino entre a mãe e o tio no recanto de um quintal em Santa Catarina no ano de 1951. Ao lado havia um forno para cozer pão alvo e onde, anos depois, minha avó materna irá fazer um delicioso pão «brindeira» com testemunhas: chouriço, toucinho, sardinhas, tudo o que sobejava do almoço e não se podia deitar fora. Ou perder. A foto era pequeníssima (Papelaria Tália – Caldas da Rainha) e foi trabalhada como peça de artesanato pelo meu amigo Carlos Vilas; é dele a arte final. A ele devo a projecção de uma pequena foto de «seis por nove» num postal maior e capaz de entra no mundo dos Blogs e do Facebook. Chamo dissertação comovida a uma crónica que parte da emoção em estado puro para um texto com organização, ritmo e coordenadas – ou seja, princípio, meio e fim. Nós, os mortais, nada sabemos do mistério da vida mas é bom que a vida seja mesmo um mistério. Se fosse um negócio os ricos compravam a saúde e morriam muito depois de nós. Estou comovido porque faltam poucos dias para o meu aniversário e assim chego à idade que minha mãe tinha em 1995. Como nasceu em 1929, tinha 66 anos; eu nasci em 1951 e daqui a poucos dias terei os mesmos 66. Que pensarão de tudo isto os meus quatro netos que neste dia tenho? Talvez chamem um dia a este avô «anacrónico» porque num tempo veloz gosta de paciência, num tempo febril gosta da calma, num tempo hostil gosta da amizade. Talvez me chamem avô «almanaque» porque se algum deles se debruçar sobre as minhas crónicas, os meus poemas e os meus contos poderá a ver neles uma cultura de almanaque. Mas agora já não existem almanaques e quando os netos forem maiores ainda menos. Não havendo almanaques mais difícil será catalogar este comovido avô de quatro netos hoje, em 25 de Janeiro de 2017. --

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por José do Carmo Francisco às 08:36

Quarta-feira, 25.01.17

do «cais dos soldados» a fernando fischer, finalmente descoberto

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Esta imagem era a que deveria ter acompanhado o meu texto publicado no Facebook. Tudo isto tem uma lógica: desde 1978 quando comecei a trabalhar no «Diário Popular» como colaborador do Suplemento Cultural ouvi, a partir de 1982, o jornalista e escritor Pedro Alvim queixar-se de o Instituto do Livro o referir numa ficha com mais ou menos isto: «Utiliza, por vezes, o pseudónimo de Fernando Fischer.» O meu mestre Jacinto Baptista (1926-1993) recomendava que um texto nunca deve ser publicado sem uma ilustração. É em nome dessa antiga recomendação que eu coloco esta imagem antiga do tempo da monarquia com os dois reinos da Península Ibérica representados por figuras ficcionadas em vez de pessoas. E faço a ligação ao caso do pseudónimo porque de facto os jornalistas do «Diário Popular» davam-se com os do «Diário de Lisboa». Agora estamos em 2017 e só hoje (dia 25 de Janeiro) descobri num livro de Pedro da Silveira («Fui ao mar buscar laranjas») esta coisa luminosa: «Em jornais insulanos ou de Portugal, numa revista brasileira de novos e noutra de espanhóis exilados no México jazem perto de duas dezenas de meus poemas mais antigos, quase todos assinados, felizmente, com pseudónimos – dos quais apenas um, usado nos Açores, não se manteve indecifrado: Fernando Fisher.» Passados tantos anos (1982-2017) a procurar descobrir uma coisa e agora, de modo inesperado, aparece a chave do problema. E nem está em causa a questão da letra a mais ou a menos. De facto Fisher não é Fischer mas não tenho dúvidas que alguém no Instituto do Livro por equívoco e não por maldade, com erro mas sem acinte, terá trocado as voltas ao pseudónimo. Coitado do Pedro Alvim que eu conheci bem graças a Jacinto Baptista: andou tanto tempo a tentar descobrir quem seria o tal Fernando Fisher ou Fischer… --

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por José do Carmo Francisco às 11:11

Segunda-feira, 23.01.17

filipa barata (1981-2014) - longa memória para a princesa do mouchão

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O nome que lhe dei nos poucos anos da nossa convivência era uma brincadeira e um jogo de palavras mas também um sorriso sobre a Geografia – chama-lhe A princesa do mouchão. Hoje esse cognome é só memória mas permanece firme no livro «Palavras sem cicatrizes» na página 75 embora não em itálico como no original. De facto coloquei o itálico em duas expressões («Escreva sobre os pobres» e «A princesa do mouchão») mas só primeiro itálico permaneceu na arte final do livro. Entre os meus dez e quinze anos vivi no Bairro do Bom Retiro em Vila Franca de Xira e de lá via-se apo longe o Mouchão da Póvoa, tal como num poema dedicado a Filipa Barata eu vim a registar mais tarde no Blog «transporte sentimental»: «Olhas a terra trazida / Pelas cheias deste rio / Milhões de dias de vida / Entre o calor e o frio.» Este livro («Palavras sem cicatrizes) com poemas de e para Filipa Barata que foi apresentado em Santa Iria da Azóia no dia em que Filipa Barata fazia 36 anos é ele num certo sentido também um mouchão, uma ilha de palavras num Tejo e num tempo de pressa, febre e indiferença. É o tempo veloz que vai depressa para o mar como a água do rio e esse tempo não se compadece com a atenção. Nem com um olhar mais demorado. É possível, é mesmo muito possível que talvez esteja nessa minha pequena brincadeira de lhe chamar «A princesa do mouchão» uma ideia mais forte porque um mouchão demora milhões de dias a consolidar. A tese de Filipa Barata sobre a obra literária de Raul Brandão mostra que ela procurava estudar os valores sólidos, os valores que ficam, os que permanecem. O mesmo é dizer assim como o Mouchão da Póvoa que eu gostava tanto de olhar entre 1961 e 1966 no Bairro do Bom Retiro em Vila Franca de Xira. --

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por José do Carmo Francisco às 20:46

Domingo, 22.01.17

«eles com a azia e a gente com a taça!» carlos martins aprendeu depressa

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Quando Vítor Serpa e Homero Serpa escrevem num livro dos CTT em 2004 («História do Futebol em Portugal») que o SLB venceu o Campeonato Nacional de 1957/58, colocam-se ao nível do pintor de paredes que na Travessa da Rabicha fez desaparecer a caricatura de um treinador de futebol do SLB ao lado da caricatura do presidente da Direcção. O vencedor do Campeonato Nacional no ano desportivo de 1957/58 foi na verdade o SCP mas isso pouco interessa. Carlos Martins que esteve pouco tempo no SLB depressa assimilou os princípios e os conceitos da Casa: vencer sempre e não interessa à custa de quê. Na primeira final da Taça da Liga o árbitro inverteu o sentido do jogo e, além de influente, foi decisivo. Carlos Martins em vez de se calar perante mais esta atitude tenebrosa veio proclamar para os jornais - «Eles com a azia e a gente com a Taça!» Fez lembrar Vata que em 18 de Abril de 1990 disse: «Então os franceses andam por aí a dizer que o meu golo foi com a mão? Eu acho que foi com o peito…» O livro de João Pombeiro «30 anos de mau futebol» (Quetzal Editora) pega nessas e noutras pérolas como por exemplo a promessa de 300 mil sócios em 2005 feita por Luís Filipe Vieira ou a Operação Coração segundo Manuel Damásio (presidente entre 1994 e 1997) quando diz em A BOLA de 26-4-1995: «Esperava uma adesão muito maior. Atingimos os 180 mil contos, verba muito aquém do que estimámos. Não se tratava de uma intenção megalómana, teria bastado que 300 mil dos seis milhões de benfiquistas tivesse correspondido.» A resposta ao falhanço da Operação Coração seria a Operação Cabeça: «Vamos contemplar sociedades nas quais o Benfica irá buscar importâncias substanciais, distribuindo posteriormente dividendos a que investir.» A ideia é de Manuel Damásio em 1995. --

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por José do Carmo Francisco às 11:54

Sexta-feira, 20.01.17

da travessa da rabicha a alferrarede - «custe o que custar e doa a quem doer»

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O médico e poeta José Falcão Tavares veio ao Facebook «pedir desculpa» pelo vandalismo de Alferrarede onde, a coberto da noite e do «veneno da madrugada», um grupo se entreteve a sujar o Núcleo Sportinguista local com inscrições. Uma delas aponta para a data falsa da fundação do SLB, data essa que copia a da Travessa da Rabicha, ali a Campolide. O gesto do médico e poeta de Abrantes só lhe fica bem mas é de todo inútil porque ao longo do tempo, desde 1908, o SLB tem-se afirmado pelo oposto: nunca pede desculpa pelos atropelos nem à Verdade nem à História. Veja-se o caso de Mário Wilson (1929-2016) que teve uma morte aproveitada na Comunicação Social como se de um jogador do SLB se tratasse. Até o trataram como «grande capitão», copiando o que lhe chamavam na Académica de Coimbra. Veja-se Miklós Fehér (1979-2004) que jogou no Salgueiros e ia para o Marítimo, estando no SLB de passagem. Veja-se o caso dos Magriços quando um selecionador obrigou José Torres a jogar com infiltrações de «novocaína» para não jogar um de dois «leões» - Lourenço e Figueiredo. Vela-se o caso do duplo rapto de Eusébio, jogador do Sporting de Lourenço Marques, raptado em Moçambique, em Lisboa e escondido no Algarve até a Direcção Geral dos Desportos decidir que o SLB pagava 400 mil escudos ao Clube a que o jogador estava vinculado. Veja-se o caso do dirigente Paiva das Neves, o homem do Terceiro Anel do Estádio da Luz, que um dia foi a Lourenço Marques saber a idade verdadeira de Eusébio. Paiva das Neves soube que o jogador nasceu em 1940 mas só foi registado em 1942. Tal situação deu origem ao facto de em 1961 a sua idade oficial ser de 19 anos e não 21; foi por isso que a mãe assinou o seu compromisso com o SLB. Veja-se o caso de na sua morte muitos jornalistas procurarem esconder que Eusébio foi rejeitado no SLB quando regressou dos EUA e teve que jogar no Beira-Mar e no União de Tomar. Veja-se o caso da brutal agressão do mesmo Eusébio em 30-4-1967 ao sócio 48787 do SLB que apenas o queria abraçar. Artur Portela Filho no Jornal do Fundão escreveu uma crónica na coluna «A Funda» com o título «Eusébio mete golo no peito de um homem». Veja-se o caso da jornada final do Campeonato de 1965/66 quando o SLB ofereceu 20 mil escudos a cada jogador do Varzim e um autocarro para o Clube se ganhassem ao SCP. António Simões escreveu na página 136 do livro «História de 50 nos do Desporto Português», edição de A BOLA: «O Benfica continuou a apostar na estratégia da motivação por dinheiro». Veja-se a Revista «Notícias Ilustrado» de 10-12-1933 com um friso de atletas do SLB na capa em saudação fascista. Veja-se como dois jornalistas (António Valdemar e Jacinto Baptista) alteram uma fonte com data de 2-12-1907 e colocam um nome que não está (nem podia estar lá) dentro de um parêntesis recto: onde está bem Sport Lisboa escrevem «e Benfica» mas o SLB só foi fundado em 1908, por isso não existe um «derby» em 1907. Veja-se o caso de Artur Monteiro (responsável pelo futebol juvenil do SLB) na página 89 do livro «30 anos de mau futebol» de João Pombeiro: «Quando saí deixei uma gaveta cheia, um verdadeiro «dossier», com bilhetes de identidade, passaportes, cédulas e certidões de nascimento falsificadas.» Pedir desculpa para quê? --

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por José do Carmo Francisco às 11:14

Quinta-feira, 19.01.17

campeonatos de portugal, ligas e outras histórias venenosas

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O livro intitula-se «Números e nomes do Futebol Português», foi publicado em 1950 pelo «Diário Popular», o seu autor é Ricardo Ornellas e tinha ao ser escrito um objectivo: «recordar os antigos e servir os novos». Mas esse objectivo foi alterado porque o próprio livro veio insinuar uma coisa embora sem o declarar de modo explícito: em 1935/36, 1936/37 e 1937/38 o Campeonato de Portugal «existiu mas é como se não existisse» porque o S.L.B. ganhou as três Ligas disputadas nessas épocas desportivas. Aí está o veneno, a falsificação, a trapaça. Vamos aos factos: em Portugal disputou-se entre as épocas desportivas de 1921/22 e 1937/38 uma prova desportiva cujo nome era «Campeonato de Portugal» e que atribuía ao seu vencedor o título de «Campeão de Portugal». O Sporting Clube de Portugal venceu essa prova por quatro vezes: 1922/23, 1933/34, 1935/36 e 1937/38. Ponto final. A História só existe com documentos e não se pode apagar. Ora acontece que, ao mesmo tempo, disputou-se nas épocas de 1934/35, 1935/36, 1936/37 e 1937/38 a Liga, uma prova experimental, por pontos, nos Domingos deixados livres pelos jogos do Campeonato de Portugal. Nessa prova desportiva (a Liga) só entravam clubes de Lisboa, Porto e Coimbra ficando de fora os clubes do Funchal, Olhão, Vila Real de Santo António, Faro, Beja, Évora, Portalegre, Braga, Guimarães e Viana do Castelo. Pelo menos estes mas deve haver mais. Depois de concluídas as quatro épocas experimentais e já com algumas melhorias no estado das vias de comunicação (estradas e caminhos de ferro) a Federação Portuguesa de Futebol organizou o primeiro Campeonato Nacional de Futebol na época desportiva de 1938/39 com a participação dos seguintes clubes: F.C. Porto, S.C.P., S.L.B., Os Belenenses, Académica (Coimbra), Barreirense, Académico (Porto) e Casa Pia. Como se vê pelo enunciado dos nomes dos clubes, apenas o Barreirense não é de Lisboa, do Porto ou de Coimbra. Os avanços são lentos num Campeonato que de Nacional tem pouco. O vencedor foi o F.C. Porto com 23 pontos e o último classificado foi o Casa Pia com 2 pontos. (a foto é da equipa «leonina» de 1923 que venceu em Faro a Académica por 3-0) --

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por José do Carmo Francisco às 12:34

Quarta-feira, 18.01.17

fala de antónio para helena na «terra permitida»

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Soube sempre, soube desde sempre que o nosso amor não seria um amor feliz mas amores felizes há muitos nos livros, nos teatros e nos cinemas. Preferi o teu encanto ao encanto da rainha Dona Amélia quando ela veio à Ilha de São Miguel com o rei D. Carlos. Nesse dia fiquei a falar contigo e não fui ver os reis porque se o meu pai não tivesse morrido pobre eu nem sequer teria um casaco para vestir. O meu amor por ti cresceu entre o cheiro da terra, o cheiro da madeira da oficina do mestre Abílio e o cheiro do licor de tangerina. O meu amor por ti cresceu também entre lágrimas. A nossa terra sempre foi uma terra de lágrimas mas lágrimas diferentes de pessoa para pessoa. O José Sobrancelha Loura fez o enterro da mulher com lágrimas porém sem música mas já o menino Horácio trouxe para o funeral da sua mulher a Filarmónica dos Fenais da Ajuda e a música era tão triste que as pessoas até choraram mais. O meu amor por ti cresceu entre a música da minha guitarra e a música de uma peça de Debussy que toquei para tu sentires a Lua mesmo sem a poderes ver. O meu amor por ti cresceu também entre as palavras para mim estranhas e o som das primeiras sílabas: água, braço, gato, rato, uva, xaile, zebra. Mais tarde eu já podia ler para ti outras palavras: «Longas são as estradas da Galileia e curta a piedade dos homens». O meu amor por ti cresceu e não vai ter fim. Já está num livro e os livros são uma memória que não deixa morrer os sentimentos das pessoas como nós. O teatro e o cinema também. Quem sabe, Helena, se um dia a minha guitarra e a tua burrinha não vão aparecer num palco de teatro ou numa sala de cinema. Quando um amor é grande como o meu, tudo é possível, Helena. Tudo é possível. --

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por José do Carmo Francisco às 10:47

Terça-feira, 17.01.17

daniel de sá - «deus está em toda a parte e na maia também»

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Num gesto de generosa simpatia, Daniel de Sá colocou a minha frágil pessoa (obscuro poeta, discreto jornalista) como «protagonista» de um conto seu publicado na Revista Atlântida de Angra do Heroísmo em 2005. A dedicatória no corpo da revista é elucidativa: «Para José do Carmo Francisco Ao poeta de afectos e ao amigo sem mácula, aqui vai a possível retribuição de tais afectos e de tal amizade, expressa no «nosso» conto que pode ler-se nas páginas 103/108. Maia, S. Miguel, 17 de Abril de 2006 Com um abraço do Daniel de Sá». Nessa narrativa (o conto «Dueto a uma só voz») o jornalista de um jornal de um Clube a acompanhar o seu Futebol Juvenil dialoga numa vila da Província (pode ser Montemor-o-Novo, por exemplo) com um homem que se recusa a aceitar a morte recente da sua mulher. Quando questionado ao portão sobre a ausência da esposa, a resposta é sempre a mesma: «Foi visitar uma prima. Já volta.» Esta recusa em aceitar a morte leva-me a pensar que só o amor pode ser a sua oposição, o seu contrário, o seu outro lado. A vida não pára, o tempo não se suspende perante nada nem perante ninguém mas o amor pode ser a única força capaz de disfarçar essa inevitável etapa da vida. Na Revista «Grotta» acabada de sair, o meu pequeno texto é uma espécie de resposta literária ao conto de Daniel da Sá na Revista Atlântida. O amor de António por Helena nasceu e cresceu contra todas as expectativas. No meu texto, modesto artefacto de palavras, a voz de António levanta-se a partir das pedras e da terra para cantar no ar da Ilha Verde um amor impossível. Parecia impossível mas é verdade. Tal como é verdade esta frase de Daniel de Sá: «Deus está em toda a parte e na Maia também.» --

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por José do Carmo Francisco às 20:27

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