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Sexta-feira, 07.10.16
sobre «pirilampos da alma» de antónio moreira pinto carvalho
A página 7 deste livro abre com a palavra «Introdução» em vez de «Prefácio» ou «Prólogo». Questão de escolha. Nela o bispo de Bragança-Miranda, D. José Manuel Garcia Cordeiro, refere o autor deste livro como «diácono» embora na página 8 já lhe chame «autor». Não é a mesma coisa pois o diácono tem funções específicas dentro das quatro paredes da igreja, sendo um mediador entre o Povo de Deus e o próprio Deus no mistério e no ministério do altar. Autor é o que cria beleza e ritmo com as palavras que valem menos de que «pétalas pisadas depois de um baile» – Maiakowsky o escreveu um dia. Outro aspecto é a contracapa onde um excerto da «Introdução» de D. José Manuel Garcia Cordeiro aparece em forma de poema e com o nome «Garcia» ignorado, desaparecido e apagado. Aqui como em tudo na vida só posso ser o que sou e dar o que tenho. Ninguém pode ser quem não é nem dar o que não tem. Aprendi em 1978 no velho «Diário Popular» com Jacinto Baptista que todo o leitor merece a indicação do ponto de partida de cada livro cuja nota de leitura vamos elaborar e assinar. Ora o ponto de partida deste «Pirilampos da alma» é a relação de causa/efeito entre os textos bíblicos, as encíclicas, os ensaios de teologia ou o catecismo da Igreja Católica e os desenhos que são quatro (páginas 9-35-69-107) para 49 poemas e 52 citações ao todo. Para quem gosta de fazer contas, convém explicar que o desenho da página 9 não tem o correspondente texto de citação, antes se segue ao prefácio de D. José Manuel Garcia Cordeiro referido no livro como «Introdução». O ponto de partida é, pois, a causa e o efeito entre a citação e a dissertação. De um lado a Bíblia, as encíclicas, o catecismo da Igreja Católica e os ensaios de teologia; do outro lado os poemas que são 48 sonetos e apenas um poema em prosa. O ponto de chegada é o poema da página 109: «As palavras que escrevo e que digo / pirilampos da alma que acendi / nos momentos mais íntimos contigo / são migalhas do amor que recebi//Foi com tua Palavra, ó Pai amigo / que quiseste nas minhas provocar / o encontro do pobre sem abrigo / com o pão que Tu negas em não dar//Pequeninos luzeiros que incendeiam / os silêncios da minha solidão / são sementes de fé que em mãos semeiam / esperanças lavradas de oração / e o chão o caminho presenteiam / p´ra rasgar horizontes de paixão!» Não é possível resumir em breves linhas o conteúdo e a forma de 49 poemas. Fiquemos pela indicação de dois aspectos: o discurso do autor e a geografia. O autor («Sem Ti não sei quem sou neste deserto») utiliza um método («Escrevo-te esta carta que o meu peito /está pedindo urgente remissão») com uma ideia formada («Não me deixes perdido, fustigado / pelos ventos desérticos da vida») pois só junto ao Senhor o poeta se sente encontrado: «É contigo que eu quero caminhar / e em Ti me encontrar se me perder». A geografia pode ficar no intervalo entre o mar e a serra. O mar tem a ver com o Turcifal («Mas agora, corridos tantos passos / sem lhe ver o calçado, nem os traços /encontrei-o nos ares do Turcifal») e a serra tem a ver com o Monte Tabor: «Andar sempre contigo ó Senhor / é ver-Te em cada rosto, em cada ser / é ter no coração do meu viver / a vida transformada no Tabor». O que torna o poeta próximo do crente é o facto de o poema ser uma forma de oração: em ambos se ligam de novo dois mundos separados pela distância, pela noite e pela morte. Em ambos os casos (poema e oração) são usadas as palavras. Ora a palavra é uma graça mas também uma responsabilidade. Na página 85 do livro «Poemas para rezar» de Michel Quoist lá surge a advertência: «Tomei a palavra, Senhor, e estou vermelho de raiva / De raiva sim pois agitei-me, gastei-me, esbanjei voz e gesto / Meti tudo o que sou em frases e palavras / E receio que o essencial não tenha sido dito / Pois o essencial, Senhor, não está ao meu alcance / E para contê-lo as palavras são estreitas de mais. / Tomei a palavra Senhor e estou inquieto / Tenho medo de falar porque é grave / É grave incomodar os outros, fazê-los sair de casa, pô-los de pé, imóveis à soleira da porta / É grave prendê-los longos minutos, mãos estendidas, coração tenso implorando uma luz ou um bocadinho de coragem para viver ou para agir / Será que não vou despedi-los, Senhor, de mãos vazias?» Por sua vez o Padre António Rego no seu livro «Eterno agora» tem um poema na página 148 intitulado «Ver bem» que conclui deste modo: «quantas vezes a mim Te dirigiste / e quantas vezes não mereci o Teu olhar/ ou o apelo sedutor da Tua apalavra // Tenho receio de esbanjar os Teus dons / e esquecer a Tua Ressurreição // Faz-me Senhor atento / ao teu afecto / às dádivas que distribuis / e às maravilhas que nos tocam // E desculpa por não saber ver-Te melhor / nos sinais do nosso tempo / quando fecho os olhos à Tua passagem / para só ver as misérias do mundo. //A Humanidade reflecte os Teus dons //Faz-nos ver isso, Senhor.» No livro «Marcha triunfal» de Júlio Dantas o recém-regressado Antão de Noronha pergunta a diversas pessoas na igreja de Santana onde estava sepultado Luís de Camões. Ninguém sabia. Uns respondiam «Quem é?» Outros: «Não sou da freguesia» Outros: «Não ouvi falar». Quando saiu da igreja Antão de Noronha viu terra revolvida de fresco mas nem uma lousa nem uma cruz.» É este o risco que corre quem pega na palavra num país de analfabetos, um país que conhece Bocage pelas anedotas e Bulhão Pato pelas amêijoas. Se Camões, o grande carpinteiro das palavras, entrou no esquecimento meses depois da morte civil muito pouco podem esperar os modestos carpinteiros, os de oficina humilde, pequena e mal iluminada. Para terminar nada como lembrar a solene advertência de São Mateus: «por toda a palavra ociosa que disserem, hão-de os homens prestar contas no Dia do Juízo, porquanto pelas tuas palavras serás justificado e pelas tuas palavras serás condenado.» --
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José do Carmo Francisco
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