Segunda-feira, 30.05.16
«Tempo de Primavera» poderia ser o título deste quadro. Mas também se poderia dizer como numa novela de Irene Lisboa «Título qualquer serve». A força do verde está bem explícita em toda a superfície. O verde é (sabemos todos) uma das cores primárias, tal como é o amarelo, o vermelho e o azul. Dizem os livros clássicos que todas as cores podem ser descritas e sistematizadas com referência a três qualidades: tonalidade, brilho e intensidade. O esplendor do verde é uma espécie de jardim do campo no meio das pedras da cidade. O quadro de Inez Wijnhorst pode ser visto como uma janela aberta para o campo, não um campo inventado, escondido ou ideal mas um espaço onde a esperança se instalou e levanta uma voz contra o cansaço, a monotonia e a rotina. Pode ser isso. Uma canção verde, intensa e clara, onde as palavras se envolvem na harmonia e o Mundo se deixa convocar pelo júbilo. Pode ser também um rumor de luz, um cenário para uma peça de teatro que de repente começa a ter espectadores atentos, fixos e entusiastas. Pode ser ainda uma sinfonia, uma orquestra formada por músicos sem fato de gala mas com talento, um som capaz de ser a voz da Terra onde a água do Inverno deu origem a uma cartografia de verde e de Primavera. O verde da paixão e da esperança que não morre mesmo quando todos os dias é preciso levantar as tábuas da indiferença, do cansaço e da solidão. Pode ser tudo. Se por tudo entendermos o sentido da paz serena e apaziguadora de todas as rotinas, de todas as desistências, de todas as amarguras. Entre o Passado e o Futuro só o verde de Inez Wijnhorst pode ser caminho de descoberta para um lugar onde a esperança se instale, o amor se revele e a alegria possa triunfar. --
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por José do Carmo Francisco às 20:45
Segunda-feira, 30.05.16
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por José do Carmo Francisco às 19:20
Domingo, 29.05.16
O título deste livro é um (feliz) jogo de palavras mas a confusão entre leite e leitura é mais vulgar do que parece: muitas pessoas só adormecem depois de beberem um copo de leite e de lerem algumas páginas de um livro. Gabriela Ruivo Trindade (n.1970) escreveu o texto e Rute Reimão (n.1972) assina as ilustrações desta história mirabolante de uma vaca que deixou de ser só leiteira para se tornar também leitora: «A partir desse dia, sempre que apanhava o senhor Manuel distraído, Felisberta pastava jornais. E nunca mais se queixou do sabor enfadonho do pasto, pois o jornal era sempre uma novidade. As notícias, reportagens, fotografias, histórias, entrevistas, obituários, anúncios, eram ruminados pacientemente enquanto as letras miudinhas navegavam, inquietas, na sua corrente sanguínea.» O resultado desta alteração na vida da vaca Felisberta foi o seu leite ter ficado com um sabor especial, único e diferente: «De tal forma que o senhor Manuel e a senhora Lucília vendiam todas as semanas litros e litros para os supermercados da região. Ficaram ricos e famosos, sem ninguém saber qual o segredo de Felisberta para ter um leite assim tão bom.» O texto é um achado, as ilustrações uma delícia, a vaca Felisberta uma figura inesquecível até pelo seu toque humanista: «Quem pensa de mais acaba por ser traído pela imaginação» - diz o livro. E ainda bem, dizemos nós, leitores felizes e reconciliados com o prazer de ler. Nota final: Para quem goste de consultar a Internet Gabriela Ruivo Trindade é autora do «papuinlondon.blogspot.com» e Rute Reimão assina o «reimao.blogspot.com». (Editora: Publicações Dom Quixote, Edição: Maria do Rosário Pedreira) --
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por José do Carmo Francisco às 11:45
Sexta-feira, 27.05.16
No texto «Erges, Ponsul, Ocreza, Zêzere, Maior e Trancão – crónica para Fernando Alves» publicado no passado dia 13-5-2016 no «Correio do Ribatejo» cometi um erro crasso que nem sequer é uma gralha. De facto chamei àqueles rios da margem direita do Tejo, rios da margem esquerda quando os da margem esquerda são outros e bem outros: Sever, Nisa, Muge, Sorraia, Almansor e Coina. Só tenho que pedir desculpa aos leitores e ao Fernando Alves, destinatário original da mesma crónica e cuja fotografia ali surge impressa. Um cavalheiro que assina Paulo Costa chama-lhe um pequeno engano mas é mesmo cavalheiro pois para mim é um erro crasso e só se pode explicar pelo facto de ter olhado para o livro «Lições de Geografia» de Faria Artur e Dias Louro de 1921 sem perceber que a esquerda e a direita dos rios se percebe a partir do lugar onde eles nascem. Neste caso é na Serra de Albarracin em Espanha. Vem a propósito referir que no passado dia 6-5-2015 publiquei neste mesmo espaço uma nota de leitura sobre Natércia Freire e o seu livro «Infância de que nasci» e pode ler-se a particularidade de a mesma ter nascido em 1920 porque uma sua irmã que tinha nascido em 1917morreu em 1919 e daí ela ter ouvido a frase «Se a outra não tivesse morrido, não te tinham mandado vir». Pois o livro «Natércia Freire» de Pedro Sena-Lino refere duas datas de nascimento: 1920 na página 24 e 1919 na página 20. Claro que a correcta é da página 124 e a outra contém um lapso. Era impossível Natércia nascer em 1919, ano da morte de sua irmã homónima. Foi só a partir do infeliz desenlace que sua mãe engravidou; Natércia Freire nasceu mesmo em 1920. Nem podia ter sido de outra maneira. Cuidado com a Internet… anda por lá muita data errada e não é só a de Natércia Freire, há muitas mais. Foto de José Cruz --
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por José do Carmo Francisco às 19:32
Terça-feira, 24.05.16
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por José do Carmo Francisco às 15:38
Sexta-feira, 20.05.16
Este livro contraria o Boletim da Junta de Província do Ribatejo de 1940 que afirma na sua página 515: «Abitureiras – Folclore, Trajos e costumes – incaracterísticos». Em 1992 arrancou o Rancho Folclórico desta Freguesia e este trabalho escrito resulta da pesquisa efectuada na localidade junto dos habitantes mais antigos nos aspectos que dão título ao volume – A Terra e o canto. Ou seja: a memória de um tempo, a geografia e a história, o trabalho e o descanso, os costumes e as tradições, as refeições e os trajos: «A localização geográfica de Abitureiras aproxima-a de outras regiões, quer a Norte quer a Oeste. O contacto com estas zonas foi comum através da visita de vendedores ambulantes e trapeiros oriundos de Minde, Mira d´Aire e Alcobaça. Traziam consigo os mais diversos tecidos como os serrobecos, as mantas de tear e de lã, fazendas também de lã, chitas, lenços, xailes, riscados e popelinas». De um lado a Terra e o trabalho: «Conseguir trabalho era uma busca constante. Percorriam-se estradas e carreiros, alqueives e cabeços, aldeias e os mais diversos lugares, na expectativa de o conseguir. Uns, conseguiam-no ao pé de casa, outros nas praças, outros ainda eram falados à porta, para trabalhar nos mais diversos locais, desde o Oeste até aos campos da Lezíria». Do outro a Festa e o baile: «Num dos cantos da sala colocavam-se os homens e os rapazes; no outro as mães e as moças, estas sentadas à sua frente. Não se permitiam, assim, grandes contactos íntimos, resumidos estes à troca de olhares e à dança propriamente dita». Daí a canção: «A casa da brincadeira / É caiada até ao chão / Por causa das raparigas / É que os rapazes lá vão». No meio, entre trabalho e festa, surge o canto que engloba os cânticos religiosos (no Natal e nas Romarias) e as cantigas ou danças: bailarico, fado, fadinho, vira, fandango, moda de roda, giraldinha, passo largo, moda de dois passos, xotiça e pas de quatre. Para quem pense o Ribatejo apenas como Lezíria e Charneca, aqui está o Bairro no seu devido lugar. (Edição: Junta de Freguesia e Grupo Folclórico de Abitureiras, Prefácio: Aurélio Lopes, Pautas e textos musicais: Bertino Martins, Posfácio: Ludgero Mendes, Nota Prévia: Francisco Moita Flores, Nota Editorial: José Ilídio Fonseca Freire) --
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por José do Carmo Francisco às 19:17
Quinta-feira, 19.05.16
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por José do Carmo Francisco às 14:09
Quarta-feira, 18.05.16
Quando, vindo de Vila Franca de Xira, cheguei a Lisboa em 1966 para trabalhar no BPA e estudar na Veiga Beirão (sem esquecer a Patrício Prazeres) o Cinema acontecia como uma resposta ao que a Vida não podia dar. No Cinema havia justiça e os bons ficavam a ganhar no fim. Ainda se trabalhava ao sábado mas quando se é novo o tempo dá para tudo. Eu fui sócio de vários cineclubes e a primeira vez que entrei numa tipografia (União Gráfica) foi para rever «gralhas» num programa do Cine Clube Católico mas podia ter sido do Cine Clube Universitário ou do ABC Cine Clube. Ou até do Imagem. Deste filme recordo os actores e as personagens que são três – Clint Eastwood, Lee van Cleef e Eli Wallach. Por esta ordem eles terão sido o Bom, o Mau e o Vilão da história de Sérgio Leone com a música imortal de Ennio Morricone, o primeiro artista/compositor a introduzir o órgão de tubos numa música para filme de cawboys. Foi, salvo erro, no filme «Por um punhado de dólares» mas isso agora é outra história. Estamos concentrados no filme «O Bom, o Mau e o Vilão» e no fim a memória que fica é de um cemitério onde um dos caixões tem moedas de prata em vez de um morto. Não tenho dúvidas hoje em 2016 que a minha educação sentimental conta com o tempo de 1966 e da minha descoberta da gramática do Cinema, uma outra educação sentimental. Se hoje tenho uma reforma pequenina é porque fui delegado sindical desde 1972 a 1996 e as promoções eram sempre para os outros. Mas não estou arrependido porque continuo a sair de casa todas as manhãs com o mesmo espírito com que saía dos cinemas nesse hoje já distante tempo de 1966. «O Bom, o Mau e o Vilão» é um filme que faz parte de mim. --
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por José do Carmo Francisco às 21:13
Quarta-feira, 18.05.16
Vinte e cinco anos depois do primeiro livro («Sandálias do Tempo»), Isabel Aguiar surge com este «Eu amo Tarkovski» dedicado ao cineasta (Andrei) e não ao poeta (Arseni) embora se trate de um conjunto de poemas. Talvez não por acaso o livro que Andrei Tarkovski (1932-1986) deixou publicado em inglês intitula-se «Sculpting in Time». De facto a natureza da sua estética é uma estética da Natureza. Filmes como «Stalker», «Nostalgia» ou «Sacrifício», demonstram (como bem assinala Paulo da Costa Domingos em «A morte dos outros») que só o escritor Marcel Proust se pode comparar ao cineasta Andrei Tarkovski pois ambos procuram o que se pode chamar o tempo absoluto. O que este livro nos revela são poemas breves, concisos, sintéticos, capazes de perguntar («Como será a infância do poeta?») mas também de afirmar «Já sabeis de nós num tempo posterior a nós escrevendo» ou então «A poesia tem de deixar esfacelado quem lê». O poema oscila entre a Natureza e a Cultura. Vejamos primeiro a Natureza: «Vêm os gansos numa correria» / «As primeiras chuvas caem». Depois a Cultura: «Em teclado negro o piano enobrece» / «Relembra os pedais do piano». Num mundo onde tudo é diferente, há coisas que permanecem iguais, situações que se repetem no mundo vegetal e no mundo animal: «E dão uvas as videiras» / «Entendem-se os estorninhos uns com os outros». Um dos poemas finais surge como metáfora da vida e do futuro, ao juntar a água e a criança: «A água alaga o campo do filme / com uma criança a olhar o céu». (Editora: Licorne, Paginação: Egora Lda) --
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por José do Carmo Francisco às 13:46
Domingo, 15.05.16
A Poesia sempre soube ao longo do Tempo chamar as coisas pelos seus nomes. Metade canção, metade meditação, a Poesia tem neste livro de Adalberto Alves (n. 1939) a força da sua segunda natureza: o epigrama, a síntese, o aforismo. Começa numa invocação: «Poesia e Música descem directamente através de uma corda etérea. São por isso as Artes Reais que reflectem a nobre e recôndita Beleza.» Esta ligação entre Poesia e Música surge de novo na página 57: «O fado foi gritado, em Aljezur, no dia em que os Árabes, ao entregarem as chaves da sua derradeira cidadela aqui, se despediram daquele mar, num último suspiro de saudade.» E continua na página 117: «Para entender a essência da música, temos de ser capazes de conceber a transgressão física da vidraça a bater na chuva.» Para concluir na página 118: «A poesia tem muito de uma prece em que nada é pedido.» A infância está presente («A minha infância não foi modesta por ter tido pouco: foi rica, porque me ensinaram a dar valor ao pouco que tinha») embora a vida do Homem na Terra oscile sempre entre sabedoria e ignorância: «Muito do que julgamos saber é pura ignorância e muito do que julgamos ignorar é pura sabedoria.» Este paradoxo («a palavra mais rica e perfurante dos dicionários») é que permite manter o sofrimento ao lado da felicidade, a diferença ao lado da semelhança. Vejamos: «A vida é uma plenitude que só faz sentido recebendo sofrimento e beatitude com igual aceitação» porque «Toda a diferença contém semelhança e vice-versa.» A realidade do aqui e do agora (2013) não está ausente destas reflexões. Primeiro o Poder que «autoriza e fomenta a mediocridade» depois a Comunicação Social e o seu «genocídio espiritual: encurralam as mentes desprotegidas nas suas alfurjas malcheirosas.» Mas há sempre uma saída, a Amizade: «Por cada nova amizade que ganhamos, refaz-se o mundo e refloresce a vida». (Editora: Althum, Editor: Luís Nazaré Gomes, Design: Susana Cruz, Revisão: Frederico Carvalho) --
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por José do Carmo Francisco às 19:49