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Transporte Sentimental



Domingo, 21.12.14

nem proença é agora velha nem o inatel passou a ser menina

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Estamos em 2014 e continuo a usar uma hoje já velha agenda de 2008, uma edição da Compnahia Liberty Seguros e do jornal «Sol» onde guardo contactos telefónicos pois nunca se sabe. Já me aconteceu perder todos os telefones (96) com a mudança de aparelho mas tal não volta a acontecer. Ao olhar com mais atenção para o mapa de Portugal que a integra descobri um erro crasso: em vez de Proença-a-Nova surge Proença-a-Velha. Mação, Sertã, Oleiros, Sardoal e Vila de Rei estão com o seu nome bem escrito mas o erro grande poisou no mapa da agenda e logo uma troca tão séria – chamar Velha a uma Nova. A Revista do INATEL (Instituto Nacional de Aproveitamento dos Tempos Livres) está por aqui perto e logo na capa dou de caras com uma frase de Carlos Capote: «A INATEL pauta pelo asseio e simpatia do pessoal». Mesmo passando por cima do «pauta» em vez de «pauta-se» no sentido de «rege-se» para poupar palavras e evitar o clássico «segue a norma», não posso deixar de parar no início da frase com «A INATEL» em vez de «O INATEL». Mais à frente aparece uma ideia sobre o INATEL de Vila Nova de Cerveira «Dizem que está um esplendor». O significado de «esplendor» é fulgor ou brilho mas o sentido da frase aponta para o adjectivo «esplendoroso» que significa deslumbrante ou pode significar esplêndido. No corpo da entrevista uma das perguntas trata de saber que faz hoje Carlos Capote aos 65 anos. A resposta é: «Estou na Servejaria dos Restauradores a incutir neste espaço os pratos tradicionais portugueses». Ora Cervejaria com «S» quando cerveja se escreve com «C» parece um absurdo mas lá está. Talvez seja do chamado «acordo ortográfico» pois os responsáveis da Revista na página 28 referem-se à «antiga ortografia» nos textos de João Cachado e Gil Montalverne. Enfim… --

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por José do Carmo Francisco às 16:28

Domingo, 21.12.14

«penélope - colectânea» de váriso autores

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Os anos 50 em Portugal foram tempos de crise, cinzentismo e repressão, tendo surgido um conjunto de Revistas Literárias (Árvore, Cassiopeia, Sibila, Távola Redonda) nas quais se iniciaram poetas hoje consagrados como Raúl de Carvalho, João Rui de Sousa, António Luís Moita, Liberto Cruz ou David Mourão-Ferreira. O ditador de Santa Comba dizia «Está tudo bem assim e não podia ser de outra forma!» mas a Poesia não aceitava a pasmaceira nacional e acantonava-se nos volumes colectivos de onde fazia partir o seu protesto. Este livro faz lembrar esse determinado tempo português. A partir do triplo motivo (Liberdade, Medo e Solidão) este livro colectivo de 218 páginas surge com vinte participantes que assinam fotos e narrativas. Edson Athayde abre o volume com um texto de três páginas, aparecendo como uma espécie de padrinho ou irmão mais velho dos outros participantes. Os nomes dos autores das fotos são: Catarina Lopes, Flávio Moreira, Felipe Almeida, Fabielle Vieira, Paulo Cintra, Marina Barbim, Ricardo Reis Pereira, Ana Costa, Cristiana Gomes e Fábio Roque. Assinam as narrativas: Álvaro Cordeiro, Ana Rita Sousa, Bárbara Lopes. Hélder Magalhães, Luísa Carvalho, Cidália Carvalho, Rita Só, Silvia Mota Lopes, Soraia Ribeiro e Vasco Ricardo. O 22º participante (André Freitas Santos) surge referido como ilustrador ocupando no índice a página 224 mas o volume tem apenas 218 páginas.
A presença do chamado «acordo» ortográfico é muito forte neste volume a começar pelo subtítulo que está com o errado coletâne em vez do correcto colectânea. Na página 38 surge rutura em vez de ruptura e Edson Athayde usa uma expressão na página 10 («estava no páreo») que só se entende no Brasil, sendo que neste livro apenas quatro participantes são brasileiros num total de vinte e dois. Como convite à leitura fica uma referência à narrativa «Coração sem-abrigo» nas páginas 45 a 68 que se revela um achado feliz na conclusão: «Vasco tinha muito mas faltava-lhe o principal que, por acaso, era a única coisa que o velho Leonel tinha, um grande coração!». Menos feliz é a articulação da narrativa não só no uso de palavras como «para» por pára (51), «faculdade» por Faculdade (51), «sítio» por país (54), «carro» por automóvel (45 e 58) «inverno» por Inverno (46), «papel» por palavras (46). «dezembro» por Dezembro (49), «célebre» por grande (50), «100» por cem (50), as repetições como «maravilhoso/maravilhoso» na página 68 ou o uso excessivo dos advérbios de modo («realmente, literalmente, lentamente») na página 65. Para além de imprecisões como «rua» Casal Ribeiro que é avenida (53) ou uma missa ouvida no Rossio (63) que é no Largo de S. Domingos ou o «instantinho» (63) entre o Rossio e o Saldanha quando é preciso mudar de linha no Marquês de Pombal. Nota final – este é um ponto de partida e não de chegada, logo o que se espera são outros e melhores trabalhos futuros, num tempo que se deseja melhor e mais feliz como os participantes deste livro merecem. (Editora: Livros de Ontem, Capa: André Freitas Santos, Revisão: Bárbara Soares, Paginação: Nádia Amante, co-edição The Art Boulevard) --

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por José do Carmo Francisco às 11:20

Sábado, 20.12.14

«autismo» de valério romão

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Valério Romão (n. 1974) é tradutor (Beckett e Virgínia Woolf), dramaturgo (autor de Posse e A mala) e contista (revistas Magma e Construções Portuárias) estreando-se no romance com esta obra de 353 páginas na qual o autismo é o protagonista. Rogério, Marta e Henrique (pai, mãe e filho) vivem todos esta doença: «E não consigo sair disto, a desordem, as mãos na boca, os saltos no mesmo sítio, o olhar vazio, a confusão, o silêncio, os guinchos, toda a parafernália que é o fogo-de-artifício pelo qual o autismo se anuncia e esconde a criança.» Henrique é uma criança diferente («O miúdo era especial, essa malfadada palavra que não quer dizer nada até ser trocada pelos cêntimos da realidade a que corresponde») ou, dito de outra maneira, «deixara de ser uma criança normal com peculiaridades para passar a ser uma criança especial com aspectos comuns a todas as crianças.» Comum aos três está a dor: «A dor tudo muda, mesmo as convicções mais enquistadas na consciência. A dor é o grande revolucionário pelo qual são feitas as revoluções mais sangrentas do interior de cada um e é pela dor que se conhecem presencialmente as várias personagens que ocupam o palco do teatro contínuo do eu.» Mas o autismo envolve também os avós maternos (Abílio e Amélia) e os paternos cujo nome não aparece – ele está detido numa prisão e ela numa aldeia do Norte. Num misto de bruxedo africano e de misantropia, Abílio afirma: «Às vezes dava por mim a abrir os olhos, no lusco-fusco de uma irradiação de candeeiro de rua que parasitava as paredes do quarto e via a sombra da minha mulher estendida , enorme colina adiposa a suar encosta abaixo o desconforto do Verão lisboeta, misto de sol, de poluição e de um ar que carrega no dorso o cheiro a sardinha assada e a mijo». Numa escrita que lembra Nuno Bragança, um dia a criança sofre um atropelamento e vai para o Hospital («Ele está mal, ele está muito mal, ele vai morrer») e ninguém comunica com os pais dentro da urgência. Às vezes, no desespero, procuram aldrabões: um que veio do Brasil, uma que veio da Alemanha e um tal Dr. Miguel Relvas. Apenas uma coincidência… (Editora: Abysmo, Ilustrações: Alex Gozblau, Revisão: Raul Henriques) --

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por José do Carmo Francisco às 08:23

Sexta-feira, 19.12.14

«áfrica - frente e verso» de urbano bettencourt

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Autor de 6 volumes de ensaio e de 9 livros de poesia e narrativa, Urbano Bettencourt (n. 1949) assina neste seu 16º título uma revisitação de África onde cumpriu uma comissão de serviço entre 1972 e 1974. O título propõe uma dupla inscrição mas nem no Natal o poema sugere alegria: «sem nozes nem lâmpadas / sem presépio nem padres finalmente / o natal escorre de saudade pelos olhos do soldado / agarrado à breda remuniciada.» O tom geral é a raiz de mágoa, título do primeiro livro do autor em 1972: «o Pedro morreu com 22 anos, tinha x metros de altura, pesava n quilos, a mina arrancou-lhe as pernas, procurei os restos e reuni-os debaixo de um mangueiro, (…) eu bebi whisky puro toda a tarde.» A alma e o corpo ocupam lugares diferentes: «Do corpo jamais se soube o que foi feito (…) mas a alma, essa mesma que foi enterrada junto ao poilão, é que continua multiplicada e enorme por dentro das noites a assombrar as bolanhas e as florestas, os riso e os poços.» O poema pode falar dos mortos em geral: «Deixem aos mortos o vinho amargo do silêncio, a taça onde uma flor de sangue aos poucos se desfolha: a paz de pinho que lhes coube é apenas a face iluminada do engano». Ou de um certo morto como o Marques: «O Marques falava demoradamente, o olhar sobre a quietação do rio. É a saturação de tudo. A caserna, o pessoal, a gritaria. Os gestos e as vozes, o rumor das armas, o cheiro e o toque dos corpos.» Na dupla inscrição a «frente» de África pode ser o poema «Não recordo o número de homens / esqueci o recorte dos ombros / contra a luz do regresso. / Apenas soube guardar de um deles o último pavor / e os seus dedos na minha carne, uma herança de sangue e morte.» Mas o «verso» pode ser esta prosa: «Se calhar, ainda te vais lembrar do tempo de África. Das gentes que viveram um pouco melhor graças a ti. Caminhos, estradas, casas, água potável. Mas a sombra das pessoas que destroçaste há-de seguir-te como um cão açoitado. E as casas a que deitaste fogo vão continuar a arder nos teus olhos.» (Editora: Letras Lavadas, Foto: Magda Medina, Capa e Grafismo: Urbano) --

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por José do Carmo Francisco às 08:57

Quinta-feira, 18.12.14

«fernando pessoa» de joãp paulo cavalcanti filho

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O autor (n. 1948) conheceu Fernando Pessoa pela voz de João Villaret em 1966 e calcula que os 30 mil papéis do poeta davam para 60 livros de 500 páginas. Mas não se intimidou no seu projecto: «o livro não é o que Pessoa disse, ao tempo em que o disse; é o que quero dizer, por palavras dele». Com 710 páginas para ler e descobrir, fica um excerto como convite à leitura: «Dois factos marcaram a vida de Pessoa. Revelou-se um político, quando, no início do Estado Novo português, em numerosos textos, apoiou um governo de direita, angariando a antipatia dos intelectuais comprometidos com a democracia. Depois, rebelou-se contra Salazar, para ganhar, também, a reação dos conservadores de todos os costados. O outro facto está ligado aos costumes, porque, em mais de uma ocasião, se pôs ao lado de poetas notoriamente homossexuais. Sem contar com a defesa que fez da escravatura, ou as críticas ao comunismo e ao cristianismo. Provavelmente por conta dessas atitudes nada convencionais, foi, durante bastante tempo, sempre mais estimado fora que dentro de Portugal. Ou, talvez, como em conversa me disse Teresa Rita Lopes, isso tenha acontecido por Portugal ser um país pequenino, onde os intelectuais se tocam nos cotovelos e todos têm inveja uns dos outros. Apenas refiro esses factos, sem ânimo (ou razão) para análises detalhadas, mas observo que talvez não por acaso, apenas o primeiro dos seus biógrafos, João Gaspar Simões, nasceu em Portugal – os demais são, na sequência dos livros, um espanhol (Crespo), um francês (Bréchon), um americano (Zenith). Certo é que só com o tempo e uma melhor compreensão do contexto histórico da sua presença, se abrem as portas, entre os seus também, para a admiração sem limites que merece. No Brasil, sobretudo, onde revela um prestígio não igualado por nenhum outro poeta português». (Editora: Porto Editora, Capa: Almada Negreiros, Design: Leonardo Iaccarino) --

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por José do Carmo Francisco às 11:49

Quarta-feira, 17.12.14

«espertezas de pedro sem» de vergíloo alberto vieira

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Poeta, ficcionista e crítico literário, Vergílio Alberto Vieira (n.1950) tem dedicado uma atenção especial à literatura para a infância em três vertentes – poesia, narrativa e teatro. Estreou-se em 1988 nesta área com «A semana dos nove dias» (narrativa), seguindo-se em 1990 «A cor das vogais» (poesia) e «O saco de mentiras» (teatro) em 1999. Este seu recente «Espertezas de Pedro Sem» integra treze fábulas em versos certeiros e felizes inscrevendo na capa e contracapa os pés dos dois netos António e Manuel. Cada fábula incorpora uma moral. A da página 15 («A mosca zombeteira») parece ser a do quadro de Alcobaça sobre a morte de São Bernardo. O povo da região diz «Uns a rir, outros a chorar; a vida é como a morte de São Bernardo!». Vejamos a fábula: «Com quem aprendeu a ser / Intrometida, intriguista, / Ninguém sabe o que dizer / Desta enfadonha fadista. / Como não pede licença / P´ra entrar na conversa alheia / Nada, enfim, lhe faz diferença. / De que há-de ela ter ideia? / A culpa é de quem a deixa / Em tudo meter nariz/ Passar tempo a fazer queixa / Até do que sabe e não diz. /Voltando à vaca fria / O que poderá ser ela / Se afinal passa o dia / A andar na boa-vai-ela? / Com meio mundo a chorar / Outro meio no pagode / Vá lá a gente adivinhar / Quem de nós zomba, se pode!» A própria ideia de «fábula» se incorpora na narrativa poética como protagonista de uma história em verso na página 5: «Estava uma fábula encantada / À janela, a ver quem passa / Quando, do leitor, cortejada / Viu perdida a sua graça / Negando-lha, por discrição / De donzela comprometida / Mais forte foi a paixão / Que inquietou a sua vida./ Porque é fatal o amor / Ficou a fábula solteira / Tornando-se, assim, do leitor / A mais fiel companheira». (Editora: Crescente Branco, Desenhos: A. Vasconcelos Lapa) --

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por José do Carmo Francisco às 18:09

Quarta-feira, 17.12.14

aniceto carmona ou a minha vida nas paredes das pastelarias

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Um dia, há muitos anos, um professor da Escola Veiga Beirão que me dava explicações de Química (Carlos Moura) disse-me que recebia e ensinava alunos nos cafés porque eles (os cafés) eram as casas de toda a gente que não tinha casa. Nesse tempo, fim dos anos 60, muitas pessoas minhas conhecidas viviam em quartos e muitas famílias habitavam em «partes de casa com serventia de cozinha». Não terá sido, assim, surpresa o meu texto sobre a Pastelaria Orion à porta da qual muitas vezes me encontrei com a minha querida mãe para lhe entregar a minha filha mais velha. Na mesma Orion o caricaturista Aniceto Carmona desenhou a minha caricatura a preto e branco, talvez porque a vida é a preto e branco; não a cores. O café Palladium (que já não existe) foi muito importante na minha educação sentimental nos anos 60. Em Évora fui cliente em cafés diversos (Arcada, Portugal, Estrela) entre 1972 e 1974 lendo jornais e livros, além de ensaiar os primeiros poemas adultos, depois dos poemas juvenis terem saído no jornal da Escola Veiga Beirão e num opúsculo intitulado «Lugar de Ser» policopiado pelo poeta/professor Manuel Simões. Em Évora me questionaram por ser «juventudista» e frequentar cafés de «ervanários», sócios do Lusitano de Évora com relvado quando o Juventude tinha o pelado – Sanches de Miranda. Mais tarde passei a ser assíduo do café Brasil e das suas garrafas de leite para a minha filha Ana Maria e do Doce Real ali ao «Pai do Vento», onde até no Verão corre sempre uma aragem fresca. No Doce Real apareciam o Alçada Baptista, o Raúl Solnado e o Eduardo Guerra Carneiro. O primeiro e o terceiro foram por mim entrevistados para «A BOLA Magazine». Tenho poemas e crónicas nas paredes da Orion e do Doce Real. Os cafés sempre foram uma segunda casa para mim. Ainda são. --

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por José do Carmo Francisco às 11:42

Terça-feira, 16.12.14

dos 70 anos da pastelaria «orion» à foto de manuel neto

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Conheci a Pastelaria Orion em Setembro de 1966 quando comecei a trabalhar na secção de Estrangeiro do BPA da Rua do Ouro e vim morar para a Travessa do Caldeira. A Orion era uma pastelaria de referência para o meu pai que de lá levava todas a manhãs garrafas de leite para as netas da sua patroa. O senhor Armando, fundador da casa em 1945, andava sempre a cem à hora, dentro e fora do balcão. As meninas do Restelo (a Verinha e a Carmucha) nunca mais as vi mas devem ser hoje já senhoras a caminho de serem avós – tal como eu que já tenho um neto na quarta classe e outros dois em colégios a caminho dos quatro anos. Pois a Orion está diferente: já a preparar os seus 70 anos, modernizou a sua decoração, tem mais luz, a máquina do tabaco deixou de estar à entrada, tudo ali parece maior. As suas broas de mel e os seus pastéis de nata continuam a ser a imagem de marca de casa mas agora juntou-se o «pequeno-almoço inglês» ao «pequeno-almoço continental» além dos bolos de aniversário e dos pudins e semifrios. A Pastelaria está muito ligada à minha vida. O meu primeiro poema adulto foi publicado no «Diário Popular» que era ali ao pé, num certo dia de Agosto de 1978 quando a minha filha Ana era entregue à minha mãe à porta da Orion, a meio caminho entre a minha casa nova (São Pedro de Alcântara) e a casa velha (Travessa do Caldeira) onde ela foi criada até aos três anos. A Orion fica na Calçada do Combro nº 1, essa bela calçada que o fotógrafo Manuel Neto aqui tão bem regista num postal da Editora «19 de Abril». Tudo isto está também no meu livro «Poemas de Lisboa e Borda de Água» (Editora Apenas Livros) com a Balada da Calçada do Combro quase ao lado do poema para uma fotografia das janelas de Manuel Neto. --

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por José do Carmo Francisco às 10:31

Segunda-feira, 15.12.14

«antes que o sol acabasse» de mário machado fraião

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Este nono trabalho literário individual de Mário Machado Fraião (1952-2010) é o primeiro livro póstumo e foi escrito no tempo em que o autor trabalhou no volume colectivo «Manuel Teixeira Gomes, ofício de viver» (Tinta da China, 2010). No poema que dá título ao conjunto se recorda Portimão: «Aqui as igrejas estão caiadas / com suas barras azuis / e amarelas / outras envelhecem / para sempre esquecidas frente ao sol». Nascido à beira do porto da Horta, o autor foi um infatigável viajante que passou por Évora: «eterno aprendiz / de feiticeiro / subindo a Rua de Machede / Ocultava / seguramente uma grave acusação / além de um ser estranho / pessoa / de fora / o frio de Janeiro percorrendo os ossos todos do meu corpo». Mas as melhores viagens são as dos barcos: «Os nomes oscilam sobre o cais / o Martim Moniz o Pedro Nunes / o Seixalense / Pequenos grupos / ou pequenas multidões / incessantemente / atravessam os longos corredores metálicos / sobre as águas / ínfimas parcelas no largo firmamento que nos cobre». Entre a terra e o mar, o barco escreve o amor: «E enquanto as madeiras rangem / pode haver / nas tábuas do casco / uma flor / o nome da mulher amada / uma estrela na proa». E a paz pode ser o outro nome do amor: «Mas se finalmente / nos decidimos a descer / procurando o vento / uma brisa aqui tão quente / com sabor a pêssegos / amêijoas / amêndoas / logo encontraremos as ondas / verdes / a espuma bravia / e uma paz imorredoira percorrerá os nosso corpos / nessa imensa água grande / onde os dois mares se confundem / e assim atravessando o Verão eternamente». (Edição: O Telégrapho – Horta, Prefácio: Victor Rui Dores, Fotografias: Renato Monteiro) --

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por José do Carmo Francisco às 10:47

Domingo, 14.12.14

«a companhia dos corvos» de joaquim do nascimento

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Depois das memórias da aldeia de Pereiros («Quotidianos de uma aldeia do Alto Douro» e «A casa e as sombras») e da revisitação ao inquérito do Ministro do Reino em 1758, Joaquim do Nascimento escreve a memória de um tempo (1963-1966) entre dois lugares – Lisboa e Inhaminga «uma vila de ferroviários localizada a cerca de 200 quilómetros da cidade da Beira na linha que, do seu porto, levava à Niassalândia». Partiram de Lisboa no Niassa: «Para Angola rapidamente e em força disse o cabrão do chefe, mas não criou condições para navegar, o filho da puta, com perdão da mãezinha dele!». Iam no Niassa «rapazes tontos, é verdade, mas foi sobre os nosso ombros que os bonzos do regime depositaram a responsabilidade de lhes guardar o Império e nós, convencidos, inchávamos o peito e fingíamos que acreditávamos». Escrita em 2008, esta viagem ao passado não se escreve contra ninguém, limita-se a ser «uma mistura de imagens e de sentimentos que vêm à cabeça como acontece quando desfolhamos velhos álbuns de fotografias». Mas não esquece o amor das mulheres («trarão nos corpos um perfume forte a feno molhado e a flores de acácia e vão trocar connosco a alegria intensa de quem se quis, só por se querer, pois elas sabem e nós sabemos que o tempo urge e o dia seguinte pode ser o último«) nem a morte dos rapazes: «O camarada que decidiu acabar com a vida ficou sepultado em Inhaminga e ainda hoje me pergunto que razões o terão levado a suicidar-se assim na força da vida». De um lado o medo («Eu senti a cor do medo algumas vezes») do outra lado os aerogramas: «a comida podia inventar-se, podia esquecer-se, as palavras não, dos pais, das noivas, das namoradas, das madrinhas de guerra, dos amigos, da família, as palavras por nada deste mundo podiam ser substituídas ou adiadas, eram elas que nos ligavam aos afectos e ao mundo.» De um lado as rações de combate («o crânio que as inventou devia comer rações de combate durante toda a vida») do outro lado os corvos que dão título ao livro: «E não é que o sacana do corvo, com umas pedras de sal por cima, um pouco de piripiri, umas gotas de azeite, assado no ponto certo, me soube melhor que o arroz de cavala, sempre arroz de cavala que há muitos dias se comia no acampamento?» (Editora Padrões Culturais, Capa: Stekloduv Fotolia, Paginação: Mário Andrade) --

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por José do Carmo Francisco às 09:34

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