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Transporte Sentimental



Sábado, 24.11.12

mais um livro de 2007

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«Pequenos elogios» de Joaquim António Emídio

Trata-se do 11º título deste autor (Chamusca, 1955) que se estreou em 1983 com
«Os dias sonâmbulos». O ponto de partida do livro é a paisagem povoada da
memória do amor:
«gosto do café sem açúcar mas peço-te / por favor um pouco da tua saliva / na
minha chávena para aprender / a gostar do café muito doce.» O poeta viaja a
partir do seu bilhete de identidade: «Sou um homem do campo / tenho as mãos
grandes / e os dedos grossos / de amassar o pão para comer». O lugar da viagem
pode ser Roma («depois de subir / uma das sete colinas de Roma / entrei numa
igreja / e cheirei as flores de um casamento») ou pode ser a Chamusca: «Os
rouxinóis já não cantam / nos salgueiros da maracha / venho de lá agora / pelo
caminho das searas / onde o rio é mais livre / sem a lembrança das margens».
Não é inocente a referência ao espaço entre terra e água como ponto de encontro
para o amor: «vem comigo apanhar sol na cabeça / e ouvir os pássaros da
vindimas / que trazem no bico as novidades da vila / e nas asas o cheiro a
mosto das adegas». O amor não é uma abstracção e só existe quando os amantes
estão perto da Terra: «Amo o teu rosto de lua azul / sonho com a tua saliva
doce / de tantos beijos adiados / sou o confidente das ervas / que crescem à
tua porta / o sol que entrou pela tua janela / sou eu a correr para ti de
braços abertos / um dia vou amanhecer nos teus olhos / e florir nas tuas mãos».
A escrita é uma viagem que tem referências: «quem me dera ter nascido / com o
coração do Ruy Belo / e o sangue impróprio / do Jorge de Sena». Para o poeta
«Os livros são crianças / a morrer de sono / comendo das nossas mãos / o pão e
o sonho». Num terreno armadilhado pelo lugar-comum, eis um livro onde a voz
própria do poeta se ergue, se articula e se projecta na memória do amor.
(Editora: Terra Branca, Impressão: Europress Lda.)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 14:55

Sábado, 24.11.12

mais leituras de 2007

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«Cartas de Marear» de Mário Machado Fraião

Este livro de crónicas trata de uma viagem no tempo português dos anos 50 e
60 em duas cidades: Horta e Lisboa. Na Horta os filmes vistos no Salão do
Sporting Clube da Horta vinham revelar um mundo «vasto e variado onde havia
muito mais na vida que frequentar as aulas, regressar a casa no cortejo dos
alunos do Liceu, vestir o fato aos domingos, pentear o cabelo, escovar os
sapatos, espera as meninas depois da missa.» Já em Lisboa o autor vem
encontrar cafés não iguais ao Internacional ou ao Volga mas onde era ainda
possível «trocar ideias, impressões, experiências, contar anedotas,
comentar estreias, novas publicações, jornais, discutir, conspirar,
escrever poemas e manifestos». Mas escrever sobre a «maior cidade pequena
do Mundo» como lhe chamou Pedro da Silveira, é também lembrar os mestres e
maquinistas dos barcos do Canal que arriscaram as suas vidas para salvar
outras vidas, doentes em perigo, mulheres em trabalho de parto: Mestre
Guilherme, mestre Alfredo Saca, mestre Augusto Pau de Lérias, mestre Simão.
Há aqui memórias de livros e autores, etapas de uma outra viagem de Mário
Fraião: Jorge de Sena, Fernando Arrabal, Gonzalo Torrente Ballester,
Teixeira de Sousa, Francisco Coloane, Vitorino Nemésio, Raul Brandão,
Carlos Faria, José Martins Garcia, Rui Duarte Rodrigues, Almeida Garrett,
Pedro da Silveira. Mas sempre, acima de tudo e para além de tudo, o
fascínio das viagens: «Pedaços de nós mesmos que sugerem o dia de São Vapor
nas ilhas pequenas, as partidas na doca da Horta, as despedidas, mulheres a
chorar, um caixeiro viajante a contar anedotas, os bagageiros transportando
as malas e os sacos de viagem pelas escadas íngremes e muito estreitas, os
diversos sinais de aviso aos passageiros, a espumas das hélices. O apito
final. Largaram-se os cabos, «adeus, adeus», soltam-se os lenços, chapéus e
cachecóis. Alguns vão a Lisboa tratar de assuntos particulares. Outros,
talvez, não voltam nunca mais.» Um livro para ler e devorar, tal a paixão
quer percorre as suas páginas.
(Fotos: Júlio Vitorino da Silveira, Edição: Albagrafe Lda., Foto do autor:
Renato Monteiro)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 14:52

Sábado, 24.11.12

mais leituras de 2007

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«D. Manuel II» de Maria Cândida Proença

O último rei de Portugal, D. Manuel II (1889-1932) não estava preparado
para assumir o trono quando as circunstâncias o obrigaram a reinar em
resultado do regicídio que ceifou a vida de seu pai e de seu irmão. Um
aspecto curioso do seu temperamento é que o rei convidou, a expensas suas,
o sociólogo francês Léon Poinsard para conhecer as condições de vida dos
trabalhadores em Portugal. Acompanhado por Matos Braamcamp e Serras e
Silva, Poinsard fez um diagnóstico imediato: «A principal causa da desordem
crónica do país reside na sua organização política dominada por uma tribo
pouco escrupulosa, ávida de poder e de proventos. Portugal está reduzido à
falência, acabrunhado sob o peso de um fisco absurdo e mantido numa
horrível situação de abandono e de atraso da qual não pôde ainda sair,
apesar dos esforços e sacrifícios de alguns homens de acção.» Outro aspecto
que revela a sua pouca preparação para reinar é o que passa na semana
anterior ao «5 de Outubro». Enquanto Lisboa vive momentos de agitação
social com as greves dos tanoeiros, dos corticeiros e dos garrafeiros, o
rei vai ao Buçaco com Lord Wellesley, neto do duque de Wellington. Na
parada militar tem a seu lado os ministros da Guerra e dos Negócios
Estrangeiros e no banquete ouvem-se «vivas» ao rei. No final D. Manuel
afirma «Conquistei hoje o Exército» mas uma semana depois surge a República
e o rei, abandonado pelo Exército, vê-se obrigado a deixar o país num iate
da Ericeira para Gibraltar tendo escrito uma carta ao chefe do Governo:
«Sou português e sê-lo-ei sempre. Tenho a convicção de ter sempre cumprido
o meu dever de rei em todas as circunstâncias e de ter posto o meu coração
e a minha vida ao serviço do meu País. Viva Portugal!»
(Editora: Círculo de Leitores, Capa: José Malhoa, Foto: Manuel Silveira
Ramos)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 14:50

Sexta-feira, 23.11.12

da minha manhã de lisboa à tua noite de sydney

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Crónica para Marta a nove horas de distância
Dou início a esta minha crónica quase-poema na Rua Garrett quando no meu
relógio são dez e meia da manhã. Na Goulburn Street em Sydney o teu relógio
marca sete e meia da tarde. Estás a iniciar o fim do teu dia na Austrália
enquanto eu estou a dar os primeiros passos da minha manhã de Lisboa. Incapazes
de tudo e também de desvalorizarem a moeda, os actuais governantes de Portugal
desvalorizam a nossa vida, tornaram tudo frágil e precário, aumentando os
impostos, o desemprego e a miséria que é bem visível nas ruas da cidade onde
escrevo esta crónica quase-poema. A tua emigração (e logo para a Austrália!)
foi um virar costas, enérgico e decidido, à realidade opressiva do Portugal
cada vez mais pobre e cinzento, triste e zangado, de bolsos vazios e pouca
roupa no corpo, a repetir no século XXI o que já tinha vivido no século XX por
Franças e Araganças ou no século XIX por Brasis e Áfricas. Ou seja - a emigrar
de novo. Tenho saudades dos nossos encontros na Mexicana da Praça de Londres e
daquelas bolachas de manteiga que não existem em mais lado nenhum. Olhei agora
mesmo para um cartaz da FNAC a anunciar hoje um encontro que aconteceu ontem
com Vasco Graça Moura. Trata-se de um volume de 84 páginas de homenagem ao
Poeta nos seus 50 anos de vida literária. São 34 os autores presentes na
antologia mas eu, que sou um deles, não soube do lançamento. Vou agora aos CTT
mandar-te o livro em envelope almofadado. Será uma maneira de ligar a minha
manhã de Lisboa à tua noite de Sydney provando assim uma ideia: nunca nada foi
mais forte do que a fraqueza de um grupo de palavras quem uns chamam poema mas
a que outros podem chamar oração. Em ambos os casos, tanto o poema como a
oração, servem para três coisas – ligar mundos, matar distâncias e secar
lágrimas.
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 12:20

Segunda-feira, 19.11.12

34 poetas em livro para vasco graça moura

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Um livro por semana 302
«a vista desarmada, o tempo largo» - Antologia em homenagem a Vasco Graça
Moura
Embora o seu trabalho se desenvolva em várias linhas (poeta, ficcionista,
dramaturgo, tradutor) foi um grupo de 34 poetas que se juntou no livro de
homenagem na celebração dos 50 anos de vida literária de Vasco Graça Moura.
Convocados por Teresa Carvalho e Maria do Céu Fialho, eis os seu nomes por
ordem alfabética: Manuel Alegre, Ana Luísa Amaral, Carlos André, Maria
Andresen, Amadeu Baptista, João Luís Barreto Guimarães, José do Carmo
Francisco, Luís Filipe Castro Mendes, Yvette Centeno, Levi Condinho, Hélia
Correia, António Carlos Cortez, Gastão Cruz, Fernando Guimarães, Ana
Hatherly, Maria Teresa Horta, Nuno Júdice, José Jorge Letria, Ana Marques
Gastão, Albano Martins, Maria do Rosário Pedreira, Fernando Pinto do
Amaral, A.M. Pires Cabral, Luís Quintais, João Rasteiro, Jaime Rocha,
António Salvado, Maria Alzira Seixo, Armando Silva Carvalho, Jorge Sousa
Braga, Rita Taborda Duarte, José Carlos de Vasconcelos, José Manuel de
Vasconcelos e Ruy Ventura.
Por razões de espaço deixo apenas uma breve citação do poema de Amadeu
Baptista. Nele se percebe como o poeta imita o crente ajoelhado no templo
quando junta de novo tudo o que a morte, a solidão e o esquecimento
ajudaram a separar: «O poeta despede-se da Sé do Porto»: São verticais as
coisas de Deus / e estou a chorar sob o transepto / da catedral da cidade
da Virgem. / De um lado a outro deste mundo, / onde a sombra se
transfigura, / em seda e tempestades luminosas, / aqui venho pela
derradeira vez, / a confirmar razões que nem sequer supunha. / Esta é a
cidade em que nasci e a rua ali em baixo, / sempre escura, foi a que minha
mãe deixou, / sem que soubesse como eu a choraria / ao percorrer esta nave
onde me vejo / cego de tudo, com o coração a arder / por não conseguir
capturar outro destino / que esta sorte sem sorte de ter de partir.»

(Editora: Quetzal, Organização: Teresa Carvalho e Maria do Céu Fialho,
Apoio: Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de
Coimbra, Capa: Rui Rodrigues, Revisão: Pedro Ernesto Ferreira)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 11:09

Domingo, 18.11.12

antoine sibertin-blanc ou o esplendor do som

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«Sete lágrimas» em São Roque para Antoine Sibertin-Blanc
Soube hoje (Diário de Notícias) da morte (física) de Antoine Sibertin-Blanc
(1920-2012) e por um acaso daqueles que só a música permite, estive ao fim da
tarde na Igreja de São Roque a ouvir uma Missa Pro Defunctis a 4 vozes e
Responsorium Tenebrae de Tomás Luís de Victoria. O Grupo «Sete Lágrimas» é
formado por dois músicos e três cantores. Este foi o melhor «Requiem» que se
podia proporcionar para aquele que desde 1966 me levou muitas vezes à Sé de
Lisboa para ouvir música de órgão. Quando estou em Londres vou muitas vezes
ouvir o titular organista da Catedral de São Paulo, um jovem músico galês de
seu nome H. Williams e já comprei na porta da catedral diversos CDs para ouvir
e oferecer. Mas a primeira escala para gostar de música foi rural e filarmónica
– aprendi a gostar das marchas graves das procissões da minha terra,
freguesia de Santa Catarina, concelho de Caldas da Rainha. Mais tarde, já em
Lisboa desde 1966, passei pelos concertos ao domingo de manhã da Banda da GNR
no Teatro da Trindade, pelas óperas do INATEL (a primeira foi La Sonâmbula de
Bellini) e, em crescendo, a música ouvida na Fundação Gulbenkian mas sem
esquecer os Festivais de Jazz de Cascais pois o ecletismo faz parte da formação
de um apreciador. Mas Antoine Sibertin-Blanc tem um lugar especial na minha
memória: foi com ele que aprendi o esplendor do som, a maravilha mágica da
orquestra que só o organista revela entre as teclas e os tubos, a contemplação
com os olhos fechados para as pequenas patifarias domésticas que nada são ao
lado das tocatas e fugas, das marchas, da alegria desenhada entre as teclas e a
pedaleira. Nota final – o programa «Música de São Roque» continua até 9
de Dezembro e prossegue no próximo dia 23 às 18 horas com alunos da Escola
Superior de Música de Lisboa – flauta, guitarra e trompa.
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 19:17

Sábado, 17.11.12

outras leituras de 2007

«Antecedentes criminais» de Amadeu Baptista

Autor que se estreou em 1982 (com «As passagens secretas») Amadeu Baptista
celebrou em 2007 25 anos de vida literária com esta antologia pessoal. Não
é fácil noticiar 263 páginas de um livro com um quarto de século de
trabalho literário. Vejamos dois dos aspectos. O poeta regista o seu mundo
pessoal no poema da página 10:
«Até que um dia, já adolescente / Descobri o poder da poesia que, a par com
o mar / aprendi a fitar com imprudência por serem / revoltosas essas águas
em que o dia / e a noite se confundem. Era essa imprudência / o desassombro
de ouvir o longínquo e o genesíaco / com homens e mulheres a recortarem-se
/ da imensidão dos tempos, a cantar a dolência / e o sublime, a invectivar
o mistério e a ampliar / o enigma que há entre os enigmas ou o surto / de
sentidos que, num sopro, agrega ao infinito / o infinito, para que haja
mais infinito no sentido.»
Mas regista também o Mundo e a História como em «Kefiah»:
«Sobrevivemos acossados, o mar como única fronteira, deserto / e
reminiscência do labor da alegria, soldados entrincheirados / esperando a
bandeira neutral da morte, o retorno às origens / o sal do sangue, as
costas voltadas para a fosforescência da pureza / uma tristeza de matizes
carregados pelo vínculo de uma cumplicidade / espoliada e incorrespondida.
/ Sobrevivemos na rebelião transfigurada, adubo e excremento dos que /
sangram, energia debilitada esperando que alguém chegue, partilhe / do
nosso pão, durma na nossa cama / e dê um passo em frente, em direcção à
nossa sede apaziguada e pelo vinagre / a ferida aberta de onde jorra sangue
e água purificadora, a coroa / de espinhos perfurando-nos as têmporas, o
chicote / queimando-nos o dorso arquejante»
(Editora: Edições Quasi, Apoio: Câmara Municipal de Almada)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 12:41

Sábado, 17.11.12

outras leituras de 2007

«Escuta o coração Mundo» de Isabel Gouveia

O título explica em parte o projecto deste livro: escutar o coração do Mundo. O
ponto de partida é o tempo: «Quando surge o Inverno, vai ficando mais difícil
dissimular a flacidez da carne e essas marcas que o Tempo lhe deixou.» Mas não
um tempo qualquer, trata-se do tempo da infância a cantar as Janeiras:
«Alegres, acolhíamos as nozes num saco de algodão, apesar de a sua casca verde
haver enferrujado as mãos modestas, calejadas, de mulheres tisnadas pelo sol
dos campos; os figos secos, retirados da palha dos tabuleiros onde eram
principesca refeição para moscas vorazes e rebeldes; as castanhas piladas e os
bolinhos esquecidos; tudo isso misturado no sorriso terno, maternal de uma
matrona bem fornida de gordura.» O ponto de chegada é o espaço: não por caso
dois lugares-praia, limite e limiar entre terra e água. Primeiro o lugar da
memória («A alegria em teu rosto… A tristeza no meu… Aquela praia
era para ti o símbolo da luta conseguida, vitoriosa») depois o lugar do
esquecimento: «Sete pedrinhas que lancei ao mar / sete pedrinhas engolidas / na
voragem circular das águas / Sete pedras, sete saias, sete dias da semana /
sete cores do arco-íris / sete, sete, a magia desse número / na praia da Nazaré
/ Cada pedra que atirava, cada mágoa que esquecia». Por fim o coração do Mundo
é o coração da Poesia e da Prosa (poemas para Cesário Verde, José Régio,
Fernando Pessoa, Teixeira de Pascoais, Pablo Neruda, Virgínia Woolf) porque
toda a literatura é uma homenagem à literatura. O coração do Mundo pode ser
também a memória de João Brandão: «Nascido na Beira Alta / nessa aldeia de
Midões / o João Brandão virou lenda / como o maior dos vilões».
(Editora – Município de Oliveira do Hospital, Capa – Manuel Taraio)

José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 12:39

Quarta-feira, 14.11.12

outras leituras de 2007

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«Termo de Óbidos» de João Miguel Fernandes Jorge

A partir do Bombarral o espaço dos poemas inclui Sobral, Delgada, Adão
Lobo, Pêro Moniz, Salgueiro, Casalinho, A-dos-Ruivos, Columbeira,
Barrocalvo, Carvalhal, Óbidos, Rio Maior, Caldas da Rainha: «Voltei ao café
onde me levavam quando rapaz. /E onde entrei algumas vezes quando ia às
Caldas. /Na parede o unicórnio, o cavalo alado, um terceiro espécime mais
pequeno que certa aura ilumina bailado em ouro de gentileza /sobre azul que
fôra turquesa e o restauro tornou azul ganga.» O ponto de partida é a
memória mas não apenas pessoal («Já passaram tantas coisas pelas nossas
mãos e imagens que foram dor e alegria já se foram além para a distância da
tela povoada de noite») mas também aberta à História: «Nem se fala sequer
de um drama esquecido – pústula de que nos envergonhamos – os
que morreram / e chegavam dentro de um caixão / nem mereceram o nome a
letra de ouro / no átrio do município ou a negro / na mais sombria parede
da igreja paroquial». A taberna, por exemplo, pode ser a doce memória da
infância («D. Beatriz tirava de dentro de um balde mergulhado no poço / a
laranjada que eu bebia em dia de muito verão») mas também o fascismo (a
taberna na política): «As tascas vendiam o negro vinho ofereciam a quem
passava o cheiro húmido moldado em serradura. / Tinham um ar soturno esses
senhores, sei hoje homens do regime». A memória viaja entre a paisagem («O
meu pai levou-me à lagoa de Óbidos e tentou mesmo as salinas de Rio Maior»)
e o povoamento sentimental da paisagem em «E eu ia com meu pai»:
«ensinou-me o bem e o mal, a recordação e o esquecimento». O único poema
fora desta geografia, memória do Liceu Passos Manuel (Lisboa), é chave do
livro: «o passado tem feridas que nunca vão sarar e se as recordo, estou a
esfregá-las com sal.»
(Editora: Relógio d´ Água, Capa: sobre desenho de João Cruz Rosa)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 23:14

Quarta-feira, 14.11.12

recado à jornalista catarina carvalho

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Furgoneta não é camioneta , Citroen não é o mesmo que Renault
A jornalista Catarina Carvalho na Revista do DN no domingo anterior à chamada
«super terça-feira» americana entrevistou um político americano de origem
portuguesa (Tony Cabral) e no meio do texto surge uma referência às Bibliotecas
Itinerantes da Fundação Gulbenkian. Tudo bem. Eu (nascido em 13-2-1951) também
aprendi a gostar de livros através dos empréstimos da Biblioteca Itinerante que
ia à minha terra, Santa Catarina – Caldas da Rainha. E ainda me lembro de
um bibliotecário simpático me dizer que «O cavalo espantado» de Alves Redol não
era para a minha idade. E não era. Mas o problema surge na referência à marca
da furgoneta e não camioneta - como por lapso aparece na entrevista. O
entrevistado refere a marca Renault mas é bem Citroen. Muita gente gosta da
marca Citroen por causa dessas furgonetas. Eu tenho comprado automóveis da
Citroen desde 1983 e nunca pensei sequer em mudar de marca. Ainda me lembro da
matrícula do primeiro automóvel que tive, um Dois Cavalos – era NH-83-30.
Posso não saber de cór a matrícula actual mas a primeira não esquece nunca.
Ainda outro dia (2012) fiquei, surpreso, comovido e parado, a olhar longamente
para um automóvel de matrícula quase igual à minha de 1983 na Rua da Voz do
Operário.
Mandei um «mail» a chamar atenção para o duplo erro mas só hoje descobri uma
fotografia que não deixa dúvidas a quem, porventura, algumas dúvidas sobre o
tema ainda tivesse. Não é o meu caso. Mas a fotografia tem outra força. Mandei,
como já referi, um «mail» para o Diário de Notícias mas não obtive resposta e
por isso aqui deixo a foto esclarecedora – o emblema da Citroen está ao
lado da cara da menina. Foi na Livraria Bonecos Rebeldes (Escadinhas do Duque)
que me emprestaram a fotografia. Obrigado senhor Vilela.
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 12:24



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