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Transporte Sentimental



Sábado, 03.11.12

outras leituras de 2007

27.jpg

«Porto – da história e da lenda» de Germano Silva

Há neste livro mais história do que lenda: a formação e a prática de
quarenta anos de jornalismo (Jornal de Notícias) levam Germano Silva para a
procura de documentos escritos. Por exemplo este retrato do Porto em 1549
dum tal Confalonieri, secretário do Núncio Apostólico a caminho de Santiago
de Compostela: «A cidade é pequena, muito linda, com muitas hortas, fontes
e tem dois mil fogos. Está cercada de muros, abundam nela os panos de linho
a bom preço. O fio é branco e finíssimo. São os mais famosos do reino. Os
ares são saudáveis e os víveres baratos. Existem muitos mosteiros. A
catedral é muito antiga embora mão seja muito grande. Há muito pescado
barato. Tudo é fresco, alegre e florido.» Desfazendo um equívoco sobre o
santo mais popular do Porto, o autor explica: «Noutros tempos chegaram a
fazer-se no Porto grandes festas ao Santo António. Na desaparecida Capelas
de São Roque, por exemplo, que ficava à entrada da Rua do Souto e que foi
demolida aquando da abertura da Rua Mouzinho da Silveira, havia grande s
festejos públicos. Os rapazes solteiros das redondezas eram os mordomos das
festas. O Santo António tinha festa também na Capela da Lada, à Ribeira, e
no seu dia as tabernas e estalagens do Souto e dos Pelames, e as estalagens
de boas tarimbas e excelentes acomodações para pessoa assim como
cavalgaduras, iluminavam os nichos do santo protector dos seus negócios.»
Quanto às lendas temos a que diz respeito ao facto de Almeida Garrett nunca
ter sido eleito deputado pela sua cidade. Segundo Camilo tal deveu-se ao
facto de o grande romântico ter chamado ao Porto «grande aldeão». O meu
voto tu não levas! - terá dito o Porto mas esse é um assunto de lenda; não
de história.
(Editora: Casa das Letras, Capa: Neuza Dias, Prefácio: Geraldo Coelho Dias)

José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 18:58

Sábado, 03.11.12

albino moura na galeria allarts ao chiado

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Dissertação sobre as «Vendedeiras de Lisboa» de Albino Moura
Na cidade antiga, entre a guerra no Castelo, a água no Aqueduto e a oração na
Sé, um alvoroço de vozes, de movimentos e de gente à janela registava a chegada
da vendedeira.
Fava rica!, vivinha da Costa!, figuinhos de capa rôta!, olha a bela castanha
assada! – eram estes alguns dos gritos cantados pelas ruas da cidade.
Serão estes, os da castanha assada, entre fumo e sal, os herdeiros actuais dos
velhos pregões de Lisboa.
Hoje o comércio mudou e já nem o padeiro bate à porta. Nem o ardina que ao fim
da tarde fazia prodígios de pontaria para acertar nas varandas dos segundos
andares da minha Travessa do Caldeira, ali à Rua Fernandes Tomás.
Esta pintura é, na sua composição, com a mulher no centro da guerra, da água e
da oração, uma memória de um tempo hoje perdido no escuro do esquecimento. As
vendedeiras já não cantam os seus pregões nas ruas da cidade. Nas grandes
superfícies há prateleiras repletas de novidades vindas do estrangeiro.
Estas mulheres maduras como as maçãs que parecem trazer nas vozes que cantam e
esta menina de branco, branco ainda não maculado pelos desgostos e pela
amargura dos dias, povoam uma paisagem que parece imóvel. A Sé, o Aqueduto e o
Castelo, juntam-se na simetria do quadro mas não participam do movimento. São
referências mas não entram no quotidiano labor de pregão e venda, sempre ao
sabor dos azares do dia. Eles (Castelo, Aqueduto e Sé) são o mundo que
permanece num quadro em permanente mutação.
Estas mulheres sabem que o tempo não se detém nunca porque a pintura é outra
coisa – como uma oração, ela junta de novo tudo aquilo que o tempo
separou.
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 18:42

Sábado, 03.11.12

outras leituras de 2007

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«A mulata do engenheiro» de Inácio Rebelo de Andrade

Poderia chamar-se «O futuro não estava lá» porque esta narrativa de 315 páginas
tem essa conclusão: trata-se de um logro, uma ilusão, uma mentira. Carolina,
menina nascida em Angola, filha de um branco e de uma negra, andava de olhos
abertos mas não via. No Colégio de Nova Lisboa as criadas e as serventes eram
negras; as professoras eram brancas. Na missa dominical os brancos ficavam nas
filas da frente e os negros nas filas de trás. Na estação de comboios a caminho
da fronteira com o Catanga (ao tempo belga) via as carruagens com bancos
estofados para os passageiros brancos e bancos de ripas para os negros. Nem uma
prolongada estadia em Lisboa onde frequentou a Universidade e onde conheceu o
marido afastou da sua mente a ingenuidade de pensar que em Angola era possível
uma convivência cordial entre brancos e negros. Foi preciso um empregado do
Clube da Companhia de Caminhos-de-ferro de Benguela adverti-la de modo brutal
para descobrir essa verdade: «A senhora não pode nadar aqui. Esta piscina é só
para brancos. Faça o favor de sair!» O episódio da piscina provoca na
protagonista uma amarga reflexão: «Tão segura das suas certezas, com tantas
leituras, com tantos estudos, porque ignorara até esse dia que na sua terra,
onde nascera meio-branca, meio-negra, os brancos mandavam porque eram brancos e
os negros obedeciam porque eram negros?» Obrigada a regressar a Lisboa por não
suportar o ambiente hostil da sua terra, Carolina percebe que está condenada a
viver entre duas terras, entre dois mundos, entre dois universos. Viaja no
paquete Príncipe Perfeito em Novembro de 1959 do Lobita para Lisboa mas sabe
que o seu futuro não está em Lisboa tal como não estava em Angola.
(Editora: Novo Imbondeiro, Capa: Francisco Amorim)
José do Carmo Francisco
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por José do Carmo Francisco às 12:04


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