Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Transporte Sentimental



Quinta-feira, 12.07.12

terceiro envio Blog

Image.jpg

Vinte Linhas 800
As bicicletas no ginásio e os ciclistas na estrada
De Ana Filipa a António Capela – pode ser este o título a ligar a prática
semanal à minha memória dos ciclistas na estrada. De um lado Ana Filipa que
ordena 15 minutos a pedalar num ginásio onde os diversos aparelhos são a
liturgia de um novo culto – um corpo mais perfeito sem toxinas e mais
elegante sem adiposidades. Do outro lado António Capela que no jornal Sporting
e na revista Flama publicou centenas de fotos a preto e branco dos ciclistas do
seu Clube. Leonel Miranda, João Roque, Joaquim Agostinho, Firmino Bernardino,
Emiliano Dionísio, José Amaro, Joaquim Carvalho, Manuel Correia – cada
nome é uma memória viva com Manuel Graça a sonhar vitórias no carro de apoio.
Eles saem da Alameda das Linhas de Torres, descem a Calçada de Carriche e lá
seguem por Loures em direcção às estradas do Oeste. Páram sempre no Gradil,
terra de ciclistas e de paixão pelo ciclismo.
Quando pedalo 15 minutos na minha bicicleta não saio do mesmo lugar e sonho com
outras paisagens. Nos olhos de Ana Filipa se projectam as neblinas da Ericeira,
a chuva da Encarnação, o fumo dos fornos do Barril, as vinhas verdes de Torres
Vedras. E os areais sem fim do meu Oeste com o puro iodo – na praia de
Santa Cruz há um poema nipónico traduzido pela nossa amiga Kioko. Nas minhas
manhãs de treino há uma memória que me conduz aos casais à beira da estrada
onde os cães ladram a avisar, onde as mulheres suspendem o gesto de estender
roupa e onde o fumo é indicador da vida a nascer todas as manhãs. Na Rua do Sol
ao Rato, na voz de Ana Filipa, estou a ouvir as cantigas das mulheres do Oeste,
nas suas tarefas repetidas mas sempre felizes. Por isso os ciclistas de António
Capela se voltam para os casais. A manhã do treino tem o usufruto da
contemplação da beleza quotidiana desta paisagem povoada.
José do Carmo Francisco
--

Autoria e outros dados (tags, etc)

por José do Carmo Francisco às 22:06

Quinta-feira, 12.07.12

segundo envio Blog

Image.jpg

Um livro por semana 290
«A viagem do Tangomau» de Mário Beja Santos
São «Memórias da Guerra Colonial que não se apagam» e há, neste livro de 518
páginas, uma viagem entre dois mundos (Europa e África, guerra e paz) e entre
dois tempos: 1968 (Mafra, Ponta Delgada, Amadora) e 2010 (o território complexo
e o mosaico humano da Guiné). Presente em toda a viagem, a literatura acompanha
o militar como contraponto à realidade que o envolve: Ruy Belo, Sophia, Pedro
Tamen, Ruy Cinatti e Herberto Helder mas também Amândio César, Tomaz de
Figueiredo, Curzio Malaparte, Kafka e Saint-John Perse. Mais tarde lê Sartre,
Conan Doyle, Kerouac, Hemingway, Graham Greene, Steinbeck e Moravia.
Muito antes de descobrir que o aerogramas eram mentiras generalizadas já o
militar se debatia entre o juramento de bandeira («Juro ser fiel à minha Pátria
e estar pronto a lutar e a dar a vida por ela»)e a guerra de guerrilha: «É para
esmagar esta subversão que precisamos de atiradores hábeis». Percebeu que
descolonização era inevitável («o que estudara sobre a presença portuguesa em
África deixara-o desenganado quanto à chamada guerra justa») e nas aulas de
Mafra ouve «críticas ferocíssimas sobretudo quanto às mentiras ou lógica de
pechisbeque porque se defendia o Portugal Imperial, agora Ultramarino.»
Quando volta em 2010 aos lugares da sua guerra, o militar sabe que «não se faz
uma viagem ao passado para amaldiçoar o presente» e o seu discurso aos antigos
comandados é elucidativo: «Quase menino e moço saí de casa de minha Mãe para me
fazer soldado como vós. Os primeiros contactos foram difíceis, nada sabia sobre
os vossos usos e costumes, aqui cheguei de barco e cedo me empolguei por este
pedaço de terra dos negros que me coube por missão ou dever por carta de
perdão. Fiz-me homem entre vós. Venho suplicar-vos que não percam a vossa
nobreza, a vossa postura senhorial a despeito de tanta agrura. O Deus
misericordioso, que nos comtempla, se exulte com a nossa alegria e me perdoe as
faltas e me conceda junto de vós, alcançar a vida eterna. Porque o vosso e o
meu Deus ditam o mesmo mandamento, amarmo-nos uns aos outros como Ele nos
amou».
(Edição: Temas e Debates/Círculo de Leitores, Capa: José Antunes, Revisão:
Pedro Ernesto Ferreira)
José do Carmo Francisco
--

Autoria e outros dados (tags, etc)

por José do Carmo Francisco às 22:05

Quinta-feira, 12.07.12

primerio envio para Blog

Image.jpg

Vinte Linhas 799
Transporte Sentimental – uma dolorosa memória descritiva
Em 1986, durante as férias de Verão em Santa Catarina (Caldas da Rainha),
escrevi os vinte poemas do livro «Transporte Sentimental» que dediquei a
Armando Silva Carvalho, Fernando J. B. Martinho e Pedro Tamen. Editado em
1987 sob a chancela da «Espiral», com apoio do Grupo Desportivo do BPA, o
livro teve uma segunda edição de 2 mil exemplares em 1999 pelo Departamento
de Cultura da CML com capa de Ernesto Matos e coordenação gráfica de
António Custódio e José Fidalgo. Lá pelos idos de 2000, numa segunda-feira,
tendo entregue o meu trabalho na redacção do jornal «O Mirante» de
Santarém, desloquei-me à minha terra para almoçar com o meu pai. Como
levava um pacote de livros oferecidos pela CML, lembrei-me de parar à porta
da Escola Secundária de Santa Catarina e procurei falar com algum dos
professores de Português. Como não havia nenhum, procurei ser recebido por
um elemento do Conselho Directivo mas não esteva ninguém para me receber.
Perante a estupefação da empregada, lá voltei para trás com o pacote dos
livros que ninguém quis receber.
Passados estes anos percebo como tudo de explica. Primeiro: há professores
de Português que não gostam de Literatura e muito menos de Poesia. O que
lhes interessa é dar o programa, receber o ordenado ao fim do mês e uma
promoção no fim do ano. Segundo: eu estava a querer dar livros e isso era,
para quem atendeu o telefone da portaria, obra de algum insólito, ingénuo e
incauto. Um autor que oferece livros é suspeito e, por isso, não tive quem
quisesse falar comigo. Terceiro: é preciso perceber que a Escola é na minha
terra mas os professores estão lá de passagem; entram de manhã e saem à
tarde mas nada os liga a Santa Catarina. Hoje, 13 anos e 7 livros depois
desse livro, eu já não vou repetir esse lapso.
José do Carmo Francisco
--

Autoria e outros dados (tags, etc)

por José do Carmo Francisco às 22:04


Mais sobre mim

foto do autor


Pesquisar

Pesquisar no Blog  

calendário

Julho 2012

D S T Q Q S S
1234567
891011121314
15161718192021
22232425262728
293031